Foi com uma enorme alegria que li a notícia que a Câmara Municipal de Viana do Castelo, deu o nome de Aristides de Sousa Mendes a uma praça da cidade de Viana do Castelo. De facto, Aristides de Sousa Mendes foi um verdadeiro herói, que muito prestigiou o nome de Portugal, ao salvar muitos judeus (e não só…) da morte nos campos de concentração, pelos nazis, quando ele era cônsul de Portugal em Bordéus.
Mas quem foi Aristides de Sousa Mendes? De seu nome completo, Aristides de Sousa Mendes do Amaral e Abrantes, nasceu a 19 de Julho de 1885, em Cabanas de Viriato, concelho de Carregal do Sal, pouco depois do seu irmão gémeo César. Ambos se formaram em Direito, na Universidade de Coimbra. Em 18 de Fevereiro de 1908, casa com Maria Angelina Coelho, carinhosamente tratada por Gigi. Aristides decidiu ingressar na carreira diplomática e, após diversos cargos nos consulados portugueses de Demerara (Guiana Britânica), Zanzibar (Tanzânia), Curitiba, Porto Alegre, São Francisco, Vigo e Antuérpia, Aristides de Sousa Mendes, é nomeado cônsul-geral de Bordéus, como é suposto a um diplomata com o seu currículo, por António de Oliveira Salazar, ministro dos Negócios Estrangeiros e presidente do Concelho de então.[1] Como curiosidade, diga-se que Aristides e Gigi, tiveram 14 filhos, rapazes e raparigas. Estamos em 1938. Três meses depois, Adolf Hitler aperta ainda mais o cerco e o terror aos judeus e desde 1933, data em que chegou ao poder, ordena a horrível «Noite de Cristal», em que as lojas dos judeus e as Sinagogas, foram atacadas e quase totalmente desfeitas. Em poucas horas, são mortos 91 judeus e cerca de 30 mil são mandados para os novos campos de concentração. No final de Janeiro de 1939, Hitler comunica «Se a guerra começar, isso significará o extermínio dos judeus europeus». A 15 de Março, a Alemanha invade a Checoslováquia, começa então a II Guerra Mundial. A 11 de Novembro, Salazar envia para os consulados portugueses a Circular 14, onde é ordenado que: «os cônsules de carreira não poderão conceder vistos, sem prévia consulta ao ministério, aos estrangeiros de nacionalidade indefinida, contestada ou em litígio, aos apátridas…àqueles que apresentem nos seus passaportes a declaração ou qualquer sinal de não poderem regressar livremente ao país de onde provêm, e aos judeus expulsos dos países da sua nacionalidade ou daqueles de onde provêm»[2]. É obvio que o ditador Salazar não quer que os judeus perseguidos pelo Hitler, não venham entrar em Portugal. Apesar disso, Aristides espera pelas autorizações para passar vistos e, entretanto, acabou por emitir vistos a um casal de judeus, a um republicano espanhol e a dezassete belgas. O ministro Pedro Teotónio Pereira, então embaixador em Madrid, fez saber o desagrado de Salazar, por Aristides o ter feito. Aristides, preocupado, mal come, mal dorme e fecha-se no seu quarto sozinho. A sua esposa Gigi está desesperada com o estado do seu marido e tenta, encoraja-lo. As tropas nazis invadem em Maio a França, após já terem avançado pelos Países Baixos. Começam então a chegar a Bordéus muitos milhares de refugiados, na maioria são judeus. Chamam-lhes refugiados, mas sabemos que fugiam da morte quase certa. Aristides resolve então, cumprir com a sua consciência de verdadeiro humanista. “Entre 16 e 19 de Junho, Aristides de Sousa Mendes, passa vistos a todos os que lhos solicitam. Dá salvo-conduto a mais de 30 (trinta) mil refugiados: entre eles 10 mil judeus. Antes que a PVDE, a polícia política portuguesa da altura, chegue a Bordéus para o impedir de continuar, Aristides vai para Bayona, onde continua a conceder vistos no gabinete do vice-cônsul local, apesar dos dois funcionários do ministério que já saí estão, com indicações expressas de o deterem. (…) A 24 de Junho, é forçado a parar. Suspenso de funções e obrigado a regressar a Lisboa, é-lhe movido um processo disciplinar. Salazar retira-lhe o vencimento, ordena a sua expulsão do corpo diplomático, proíbe-o de exercer advocacia e recusa atribuir-lhe uma reforma. Aos 55 anos, Aristides fica impedido de trabalhar e o seu nome é socialmente banido pelo Estado Novo. Ninguém dá emprego aos seus filhos adultos, que são forçados a emigrar.[3]”. Pobre, a sua casa (disseram-me pessoalmente pessoas da sua terra, que até os móveis da sua casa teve de vender para comer e dar de comer aos seus filhos) e bens da família são vendidos para pagar as contas que se vão acumulando. A 2 de Abril de 1954, morre na maior miséria, no Hospital da Ordem Terceira. Sem ter sequer um fato, é enterrado com o hábito dos monges franciscanos. Ao seu funeral apenas os familiares mais chegados puderam assistir. A imprensa não fez qualquer referência ao óbito…
“Ao regatar 30 mil “refugiados” das prisões nazis e cerca de 10 mil judeus da morte certa, Aristides de Sousa Mendes é o ser humano que, sozinho, mais homens, mulheres e crianças salvou do extermínio nazi.[4]”
Há vinte árvores plantadas em sua memória nos terrenos do Memorial do Holocausto, em Jerusalém. Há uma Praça com o seu nome em Viana do Castelo. Há uma árvore da vida plantada em cada um dos nossos corações!
[1] -Dados recolhidos no livro, Heróis de Portugal – Viagem Emotiva pela nossa História, de Pedro Marta Santos, páginas 127 a135, Editora Guerra & Paz, Lisboa, 2020.
[2] – Idem, página 128.
[3] -Idem, página 134.
[4] – Idem, Ibidem, página 135.