Geralmente pensa-se que os preconceitos são todos negativos. Não é assim. Grande parte do que nós pensamos é preconceito. O que é opinião, sentimento, intuição, hipótese ainda não sujeita à crítica e à comprovação, é preconceito. Será positivo se nos conduz a procurar a sua comprovação e objetividade. Será negativo se nele nos fixamos como sendo uma verdade certa, sem a termos comprovado. Infelizmente, somos conduzidos, facilmente, por afirmações, opiniões e sentimentos não submetidos à crítica, não comprovadas. Por essa razão, geralmente, consideramos os preconceitos como negativos. Falta-nos o hábito e capacidade de crítica. No entanto, só podemos evoluir e progredir, humanamente, indo além dos preconceitos, com capacidade crítica acerca do que nos ensinam e do que nos dizem. Poderá também parecer negativo o sentimento de PERPLEXIDADE, mas não é. Há dias, li uma análise sobre a situação económico-financeira do país, feita, com rigor, por um analista muito competente. Descrevia com objetividade todos os sectores, sector por sector, indicando as suas virtualidades, as deficiências e, também, as correções de que necessitavam. Porém, terminava a análise dizendo-se perplexo, porque, não havendo recursos suficientes para resolver as deficiências, não estava seguro sobre as decisões prioritárias que teria de aconselhar a quem tivesse de decidir. A seriedade de quem pensa, de quem analisa, e de quem decide não pode deixar de passar pela perplexidade. A perplexidade é o primeiro passo para decisões sensatas e justas.
É fácil dizer aos outros o que devem fazer, mas ficamos perplexos quando temos nós de resolver uma situação complexa da qual não podemos escapar. A perplexidade deve-se, precisamente, à complexidade da nossa vida.
As palavras “complexo” e “perplexo”, têm a mesma origem no nome latino “plexus”, que designa um entrelaçado, um entrançado. A perplexidade é, pois, o estado de espírito de quem tem de decidir sobre a prioridade de um entrançado de situações com múltiplas variáveis, de que podem resultar efeitos insatisfatórios, indesejáveis ou até perversos.
Basta um mínimo de consciência do mundo em que vivemos para ficarmos seriamente perplexos, sem percebermos bem o que nos acontece, e sem podermos resolver o que origina a nossa perplexidade, frustrados pela nossa impotência.
As guerras são, evidentemente, as situações que mais dramaticamente nos deixam perplexos. Naturalmente, todos desejamos a paz. As guerras são abomináveis, mas parecem surgir, aqui ou ali, como se fossem uma surpresa, porque nem sempre temos conhecimento delas. Não nos falam delas, para não andarmos tão perplexos. Realmente, as guerras são um fenómeno permanente, que não gostamos de recordar, até rebentarem perto de nós, ou até que os seus malefícios perturbem o nosso conforto. Se os humanos abominam as guerras, porque surgem as guerras? As suas causas representam um emaranhado de motivações e ambições complexas, nas quais também nós estamos implicados, sem nos darmos conta, e nas quais nos implicamos depois, até com paixão e com preconceitos.
Neste momento, estamos sob o efeito desolador da guerra que a Federação Russa impõe à Ucrânia, com efeitos devastadores globais: cidades arrasadas e devastadas, milhares de mortos e feridos, milhões de deslocados, milhares de milhões de dinheiro perdido, risco de fome em muitas regiões miseráveis, impedidas de aceder aos cereais, perturbação generalizada dos sistemas financeiros, dos preços de matérias-primas, e tantos outros perversos efeitos de ordem psicológica e moral. Sentimo-nos profundamente prejudicados por estes malefícios. Talvez nos julguemos apenas vítimas, porque não estávamos despertos para as situações que já, de longe, preparavam a guerra. Depois, duplamente perplexos, julgando-nos apenas vítimas, com as nossas opiniões e preconceitos, discutimos, como se a guerra das armas tivesse de se transpor, do seu lugar material mortífero, para uma guerra generalizada das nossas mentalidades e paixões, como se tivéssemos de partilhar igual irracionalidade.