Os santamartenses têm boas razões para se orgulharem, pois uma filha da terra, Joana Francisca Ribeiro, obteve a classificação de 20 valores com a dissertação de mestrado em Bioquímica Aplicada, na Universidade do Minho. E boas razões para esse orgulho, porquanto, além da classificação máxima, importa ter presente o tema discutido e o seu contributo para a ciência, relacionado com a doença de Alzheimer. Com efeito, a dissertação intitula-se ”Development of exosome-inspired nanovectors for RNA delivery” (Desenvolvimento de nanovetores inspirados em exossomos para entrega de RNA). Impunha-se a busca de melhores esclarecimentos e nada melhor que ‘ir à fonte’.
Questionamos a Joana Francisca sobre o assunto versado e o seu contributo científico, ao que nos respondeu: «Vou ser muito sucinta em relação ao assunto da minha tese, dado que de momento estamos a trabalhar em artigos científicos ainda não publicados. A minha tese teve como objetivo criar dois modelos da doença de Alzheimer, de modo a que seja possível testar compostos promissores contra esta doença. Após criar os modelos da doença que apresentam características bioquímicas idênticas ao cérebro de doentes de Alzheimer, foi possível focar-me em testar terapias que de algum modo revertessem os danos moleculares provocados. Para isso foram produzidas nanopartículas de conteúdo lipídico, que incorporaram dois tipos de moléculas de RNA. Foi também testado um composto isolado de um organismo marinho, que apresenta 6 vezes mais eficácia na inibição de uma enzima, quando comparado com um dos cinco fármacos que são atualmente aprovados para o tratamento da doença de Alzheimer.»
Relativamente ao contributo científico, diz-nos: «No ano de 2019 foram registados mais de sete milhões de pessoas afetadas pela doença de Alzheimer em todo o mundo. Isto deve-se a vários problemas: (1) mecanismo patológico desta doença ainda não é totalmente compreendido até à data; (2) esta doença envolve vários ”hallmarks”; (3) a existência da barreira hematoencefálica, que é uma barreira especializada com vários tipos de células que protege o cérebro e devido a isso, é difícil algum fármaco a atravessar e chegar ao cérebro, onde precisa de atuar, e (4) até ao momento só existem cerca de cinco fármacos aprovados pela FDA, sendo que quatro dos mesmos apenas aliviam os sintomas da doença e não param a sua progressão. Devido a estes motivos, existe uma urgência médica na procura de novas estratégias eficazes para encontrar uma solução para esta doença. A terapia de RNA e a sua incorporação em nanovetores tem crescido muito nos últimos anos, também graças à vacina desenvolvida para a COVID-19 e, por esse motivo, pode ser uma ótima estratégia para a doença de Alzheimer, e para muitas outras que ainda não possuem uma cura.
Infelizmente, apesar de todos os esforços científicos, ainda existe uma grande margem de estudos que precisam de ser realizados, pelo que, o trabalho que realizei na minha dissertação, quando for publicado, pode ter um impacto positivo na comunidade científica, ajudando outros cientistas a chegar mais longe, do mesmo modo que o trabalho deles me ajudou a mim.»
Questionada até onde pretende chegar com o trabalho desenvolvido e se há possibilidade ou crença em ir mais além, disse que graças aos resultados promissores que obteve nos ensaios realizados e uma vez que é uma área que tem ainda muito trabalho intensivo que pode ser feito, sem dúvida que acredita que este trabalho pode crescer mais.
Perguntada em que fase da vida surgiu a vocação pela área seguida, respondeu: «Quando estava ainda a terminar a licenciatura apercebi-me que adorava trabalhar no laboratório e seguir o ramo da investigação. Como costumo dizer, no laboratório sinto-me em casa. Além disso, adoro estudar e produzir trabalho laboratorial, principalmente quando está associado a uma aplicação médica.» Este último ano de mestrado foi fundamental, acrescentou, para se decidir por continuar o ramo da investigação, no que, segundo afirma, «tiveram incrível influência os seus orientadores e o grupo de investigação que a acolheu.»
A Joana Francisca integra a conhecida família Souto, nossos estimados assinantes. São seus pais o casal Cesário e Zulmira, e avós paternos Luís Gonzaga e Julieta. Trata-se de uma família que, segundo diz, sempre a incentivou a seguir os estudos académicos, independentemente da área, e que, sem dúvida, tiveram uma influência muito positiva no decorrer destes últimos anos. Sempre a incentivaram nos momentos de maior fragilidade, para além de, designadamente os seus pais e irmã Marta, que vê como pessoas que venceram na vida serem, simultaneamente, referência e inspiração.
Agradecemos a disponibilidade e saudamos efusivamente a nova mestra. A Aurora do Lima faz votos e acredita que o futuro da Joana Francisca se traduza em retumbante sucesso perante investigação tão desafiante, de que se esperam bons frutos para, nomeadamente, a farmacologia e ciência médica. O mundo agradece.