Empresa ultrapassa “várias dificuldades” e mantém-se na mesma família

Os registos do início da laboração perdem-se no tempo, mas o legado familiar não quer ser deixado. Luís Ribeiro continua à frente da empresa, que surgiu com os bisavôs, passou para os avós, pais e agora está nas mãos dos quatro irmãos.

Apesar de apontarem a data da fundação da Padaria do Souto em 1880, o documento mais antigo que tem é um Alvará de 1932. Quando chegamos à rua do Embarcadouro do Pinheiro, em Santa Marta de Portuzelo o cheiro a pão entra-nos pelas narinas. O local onde surgiu permanece na atualidade, tendo sofrido ao longo do tempo aumentos e reorganização do espaço. Contudo, a vontade é permanecer nas origens e manter o saber e sabor tradicional.

“O meu pai, como era o filho mais velho ficou com a casa e à frente da Padaria. Quando os meus pais faleceram passou para nós, que somos quatro irmãos”, revela o atual gerente do espaço. Luís Ribeiro adiantava que após a reforma da atividade profissional, em 2015, decidiu dar continuidade ao negócio familiar. “Não posso negar que tenho orgulho que a empresa se mantenha na família, mas dar continuidade é um bocado de arrogância da nossa parte, porque não sabemos onde vai parar, mas gostava que continuasse”, sublinha o enfermeiro reformado de 61 anos.

A história da Padaria do Souto está também ligada à história do país e região. Luís Ribeiro dá conta de que a empresa familiar e secular já ultrapassou várias crises. Durante a 2.ª Guerra Mundial fala do “racionamento das farinhas”, da “subida vertiginosa dos preços” e da capacidade do avô em “ultrapassar no seu tempo a pouca quantidade das farinhas”, recorrendo às farinhas americanas.

Já no período mais recente, Luís Ribeiro aponta a pandemia de Covid-19, que obrigou a reajustes e  investimentos. “Tivemos de cumprir as regras da Direção Geral de Saúde (DGS) e felizmente nunca fechamos a porta”, salientava. Adiantando ainda que “não necessitamos de recorrer aos apoios de lay-off do Governo”, apesar de termos sentido uma quebra das receitas e termos tido alguns colaboradores que foram também infetados pelo novo coronavírus. Luís Ribeiro defende que “as empresas médias e pequenas tenham mais apoios, nomeadamente apoio económico, financeiro e logístico, quer da Comunidade Intermunicipal do Alto Minho, quer da Associação Empresarial de Viana do Castelo (AEVC) para que aquelas sejam capazes de serem proativas no sentido de serem uma mais-valia.

Considerando ser “uma façanha”, a manutenção da empresa na família, Luís Ribeiro não esconde o “orgulho”, mas também fala das dificuldades. “É muito difícil. Eu faço muito esforço para dar continuidade”, não sabendo se a Padaria do Souto permanecerá na família. “Tenho um filho e dois sobrinhos. Agora não sei se vão continuar ou não”, esclarece.

“A resilência é o segredo”

A Padaria do Souto mantém muitos dos métodos tradicionais de confeção do pão e muitas das máquinas utilizadas têm mais de 80 anos. A cozedura é feita em forno de lenha. A massa, como referiu um funcionário já com alguns anos de casa, é amassada industrialmente, mas é estendida, cortada e moldada manualmente. O cozimento a lenha “conserva todo o sabor” e “recebe as necessárias doses de amor” fazendo com que os clientes sejam originários desde Areosa até Lanheses. “Nós fazemos rotas muito rentáveis. Nós seguimos determinadas rotas com elevada densidade habitacional e as pessoas aderem. Temos uma zona grande, Areosa; Viana; Meadela; Santa Marta; Perre; Outeiro; Serreleis; Cardielos; Nogueira; Torre; Vila Mou; Meixedo”, salienta Luís Ribeiro. A par da venda de pão no estabelecimento, em Santa Marta, a Padaria mantém a venda de pão porta a porta em várias freguesias do concelho. 

Quando questionámos qual o segredo para a permanência no ativo, o responsável diz que “é a resiliência”. Acrescentando: “temos de ser resilientes e adaptar-nos às novas circunstâncias. Atualmente estas mudam vertiginosamente”.

Segundo Luís Ribeiro, a indústria de panificação “trabalha com muito afinco e tem de trabalhar muito bem para sobreviver, porque não é uma indústria de riqueza e de mais-valia”. Lamentando a “concorrência desleal dos supermercados”, que baixam os preços do pão.

Com a subida dos preços das matérias-primas, Luís Ribeiro conta que aumentou o preço “o mínimo possível”, e revela: “estamos a ter prejuízos. A guerra mesmo que pare agora vai ter impacto em muitos produtos”, assegura. Dando conta de que “a Ucrânia é o celeiro da Europa”. “Nós [Portugal] poderíamos apostar na produção de cereais, porque temos condições para isso”, diz, afirmando que “90% das nossas matérias primas vêm de fora de Portugal”. 

Broa é um dos ex-libris da Padaria

A receita da broa, um dos produtos mais procurados, foi sendo melhorada ao longo dos anos. Luís Ribeiro mostra-se orgulhoso por também ter contribuído para o sucesso deste produto.  “Eu contribui para melhorar a receita da broa. Aos 14/15 anos o meu pai colocou-me a fazer a broa. Nessa época a receita  tinha pouco centeio e eu comecei a introduzir alguma quantidade de centeio. Depois houve outros melhoramentos”, conta.

Este produto é cozido duas vezes por dia, de madrugada e ao início da tarde. Os ingredientes e a cozedura lenta, cerca de uma hora e meia a duas horas, fazem a diferença no produto final, que é apresentado em diferentes tamanhos.

Em 2019, receberam da Junta de Freguesia de Santa Marta de Portuzelo a distinção de “Prémio Vida”. No ano seguinte, a autarquia vianense elaborou um roteiro das lojas mais antigas considerando-as “Lojas Memória”, onde a Padaria do Souto está incluída. Em 2021, e aquando da cerimónia do Dia da Cidade de Viana do Castelo foi considerada “Instituição de Mérito” empresarial.    

Item adicionado ao carrinho.
0 itens - 0.00

Ainda não é assinante?

Ao tornar-se assinante está a fortalecer a imprensa regional, garantindo a sua
independência.