Ainda os livros

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Gonçalo Fagundes Meira

Não era minha intenção voltar ao tema, porém falar de leituras é quase tão excitante como ler. “À boleia”, entendi obrigatório fazer uma pequena abordagem a um livro que, não sendo muito atual no tempo, jamais perderá atualidade na matéria.

Antes, aproveito e manifesto o meu apreço por um escritor que, apesar de pouco divulgado, está considerado um dos maiores romancistas do século XX. Trata-se de José Rodrigues Miguéis (1901/1980), que nos legou uma obra diversificada, com cerca de um vintena de livros e uma imensidade de textos publicados pela imprensa em geral. Numa das primitivas feiras do livro em Viana, aconselhado, comprei o seu romance “A Escola do Paraíso”. Li-o num fôlego. E o prazer foi tanto que em nova passagem pela feira adquiri a maior parte da sua obra.

“A Escola do Paraíso”, que muitos consideram um livro autobiográfico, tendo como personagem central o menino Gabriel, descreve de forma emocionante a vida social da cidade de Lisboa do princípio do século XX, local onde o autor nasceu e viveu grande parte do tempo (proscrito pelo regime, radicou-se nos Estados Unidos a partir de 1935, onde veio a falecer). O passado desperta sempre em nós um sentimento nostálgico, mas se alguém fala dele numa narrativa sentida e direta, eivada de pormenores de vivências, conseguindo fazer-nos figurantes desse tempo, então temos mesmo que ser tocados pela obra. Por mim não resisti a relê-la decorridos alguns anos.

Mas a minha proposta efetiva de leitura vai noutro sentido. Trata-se do livro “Máscaras de Salazar”, de Fernando Dacosta (sucessivamente reeditado). Fernando Dacosta, na década de 1960, na qualidade de jornalista, trabalhou junto da Assembleia Nacional e do Conselho de Ministros, tendo criado com D. Maria, a governanta de Salazar, uma relação empática ao ponto de se tornar seu habitual confidente. Isso e a relação amistosa com figuras gradas do regime e a socialite da capital proporcionaram-lhe todas as condições para que, de modo factual, pudesse fazer o retrato do Salazarismo.

Em meu entender, trata-se da obra que melhor explica e comprova porque suportamos 48 anos um regime que assentava em princípios opostos à realidade do mundo, legando-nos um país tristemente atrasado em todos os domínios, em guerra com as colónias e em confronto com a lógica do tempo, rejeitado pelas nações em geral. Ler “As Máscaras de Salazar” é estar habilitado a poder dizer Salazarismo jamais.

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