A nossa presença na Romaria d’Agonia

Era ainda garoto sem idade para frequentar o ensino primário quando, pela primeira vez, me levaram à festa da Senhora d’Agonia. Lembro que, naquele tempo, era mais comum falar-se em feiras novas de Viana do que propriamente em festa ou Romaria como mais tarde haveria de chamar-se. Eu não recordo se era hábito corrente os meus pais levarem, anualmente, a nossa família ou parte dela, “a banhos”, como era então comum dizer-se, por altura das festividades.  Eu ainda consigo lembrar-me da minha primeira vez, foi uma estadia durante algunsdias numa das casinhas do lado poente do Campo d’Agonia, alugada temporariamente, e de me acordarem antes do sol despertar para me conduzirem até ao mar ali ao lado, ao som do qual adormecia, com o fim de me alagar, vestido, com a água salgada da crista das ondas a desfazerem-se contra o rochedo onde me abrigava refugiado nos braços da minha mãe. Conservo, também, a visão desfiada de ter entrado num amplo barracão construído em madeira no topo norte do Campo d’Agonia, vindo alguns anos depois a saber que se tratava de um redondel amovível para espetáculos de tauromaquia.

Já adolescente, fui acompanhando, sem participar, a atividade folclórica do Rancho da Casa do Povo de Lanheses, entretanto criado pelo então professor do ensino primário Gabriel Gonçalves, cuja direção ficou posteriormente entregue a Rogério Dantas Rio e Rogério Pimenta Agra. Inicialmente, e por alguns anos, a atividade do Rancho restringiu-se à participação anual no cortejo das atividades rurais e industriais e do desfile das Mordomas na Romaria, sendo constituído maioritariamente por elementos do sexo feminino, vestindo o tradicional e variado traje regional minhoto, seguindo à frente do conjunto um casal de noivos trajando ambos (a noiva oirada) os típicos fatos pretos cerimoniais. 

Como referência às atividades predominantes na época, sendo a cerâmica e a olaria as mais representativas, as raparigas levavam apoiada no quadril uma cantarinha de barro cor laranja ou preta. Nem todas as componentes do grupo vestiam fatos que lhes pertenciam pelo que as moças que o não possuíam recorriam ao empréstimo de quem os tinha, mas não tencionava participar. 

Cada elemento recebia dez escudos pela participação, mas, no caso das lavradeiras que usavam fatos emprestados nem sempre beneficiavam do dinheiro porquanto eram coagidas a entregá-lo à dona da roupa no ato da devolução…

Com o decorrer dos anos, o Rancho Folclórico da Casa do Povo de Lanheses organizou-se, cresceu e impôs-se pela qualidade das exibições e originalidade dos temas adotados, tendo no reportório um número endógeno de dança, único no panorama do folclore português, conhecido como “saracu”; internacionalizou-se, fazendo digressões por diversos países e em Portugal, incluindo as Regiões Autónomas, ganhou fama e consideração; promove anualmente um festival de folclore ao ar livre, na sequência da tentativa de Rogério Pimenta Agra conseguir vingar a sua ideia de criar um “festival de inverno” anual, tendo efetivado algumas edições no gimnodesportivo da Casa do Povo, de que ele era, então, presidente.

 O Rancho Folclórico da Casa do Povo de Lanheses participa regularmente na Romaria da Senhora d’Agonia, quer no espetacular desfile das Mordomas, quer no Cortejo etnográfico, em cujo carro ornamentado leva um grupo de lavradeiras e mostra um enorme cântaro que simboliza o que em tempo representou a principal indústria da Freguesia de Lanheses: a indústria do barro; atua, também, no palco do Jardim Público nas noites da Serenata sendo uma das mais requeridas representações folclóricas do nosso inigualável Minho.

“Habemos de ir a Biana…”.  

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