A prosperidade que tarda(2)

Boa parte da sociedade portuguesa deixou-se envolver na discussão estéril da criação de um museu dedicado a Salazar. Compreendo o protesto de muitos contra uma pretensão velhaca de uns quantos saudosistas, mas subscrevo por inteiro a posição da historiadora Irene Pimentel, quando esta diz aprovar a criação do dito museu desde que este retrate na plenitude o ditador de Santa Comba, não escamoteando o cortejo de misérias que resultou dos 48 anos da sua governação, onde cabem, entre outros males, o país rural, triste e atrasado que nos legou; o nosso isolamento no contexto mundial; o encarceramento e, tantas vezes, a liquidação de opositores políticos; e a guerra colonial que nos custou milhares de vidas.

Mas o Estado Novo teve o seu fim em 1974. E se a sociedade portuguesa soube evoluir satisfatoriamente a todos os níveis, também estamos longe de ter feito o que de todo era necessário, especialmente no domínio do crescimento económico, sem o qual não é possível melhorar as condições de vida das pessoas. Não vale a pena reivindicar quando pouco existe para distribuir. Podemos exigir sim uma melhor distribuição da riqueza existente, mas ir além disso é pura utopia.

Apregoou-se muito a construção de um Portugal desenvolvido e debitaram-se repetidamente projetos para crescermos e nos aproximarmos da Europa que nos acolheu, mas o sucesso está bem longe do desejado. É um facto que somos parcos em recursos, mas os que dispomos também não foram convenientemente explorados, nem se pensou numa economia partindo da nossa própria realidade, porque há países na Europa a que pertencemos que, tão limitados tanto quanto nós em valores, souberam encontrar o seu caminho próprio e aproximar-se da prosperidade.

Por mais otimismo que nos queiram vender, o que se constata é que estamos a dar passos curtos num trilho onde precisamos de nos deslocar aceleradamente. E, paradoxalmente, teimamos em debater o acessório, esquecendo o essencial.

Quem diria que nas agendas de partidos com assento parlamentar até cabe o serviço nacional de saúde para cães e gatos. Não o temos suficientemente para as pessoas, assistindo diariamente à sua degradação, mas alguém o propõe para os animais. E parece que, obedecendo ao politicamente correto, poucos estarão apostados em denunciar propostas que não passam de aberrações. Mas deixemos o assunto para outras crónicas.

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