António Lúcio Baptista é médico especialista em cirurgia cardiotorácica, consultor em saúde e investigador, e esteve à conversa com A AURORA DO LIMA. Consciente das dificuldades atuais, defende que o Exército devia estar na linha da frente no combate à pandemia do coronavírus.
Com toda a classe médica focada no coronavírus, António Lúcio Baptista receia que outras patologias fiquem para segundo plano. “Temo que muitos doentes com outras patologias, também graves, não estejam a ser tratados em tempo real por causa da pandemia”, revela.
Apesar de estar em quarenta, disponibilizou-se para esclarecer dúvidas a todos, e adianta que, neste momento, já há muitos profissionais de saúde infetados. Contudo, não tem dúvidas que outros profissionais que estão na linha da frente também serão infetados, nomeadamente bombeiros e polícias.
Defendo a união de todos para “combater o flagelo”, o médico espera que após o surto sejam tomadas medidas pelo Governo e União Europeia que evitem o “colapso económico”.
A Aurora do Lima (AAL): Como médico, como está a acompanhar esta situação?
António Baptista (AB): Estou a acompanhar por fora e por dentro, com grande preocupação. Eu próprio estou de quarentena sem sintomas.
AAL: Há dias Miguel Guimarães, Bastonário da Ordem dos Médicos, falava que estamos perante uma guerra biológica. Concorda com esta afirmação?
AB: Esta linha de pensamento tem alguma lógica e resulta da opinião de vários conselheiros internacionais. De facto, no terreno a situação é comparável. Daí a ideia do Sr. Bastonário, de havendo nas Forças Armadas altas patentes especializadas em guerra biológica e atómica, poderiam ser estes a coordenar toda a ação. Há fundamentalmente três potências que treinam diariamente guerra biológica: a China, a Rússia e os Estados Unidos da América. Na Europa apenas tenho conhecimento da Alemanha. Por exemplo, o caso do hospital chinês construído em 10 dias aponta para um treino nesse sentido.
AAL: Como é que o país pode atuar?
AB: Não é altura para críticas, mas sim para a união no combate ao flagelo. O país está a enfrentar de modo reativo. Talvez devesse ser mais proativo, uma vez que já há ensinamentos da China e da Itália. Este vírus, sobre o qual ainda pouco sabemos, e cujo nome é SARS-Cov-2 causa a Covid-19, e tem grande virulência.
AAL: Tem conhecimento de médicos infetados?
AB: Os médicos, os enfermeiros e todo o pessoal de saúde estão, no caso português, na linha da frente. Há muitos médicos e enfermeiros infetados com o coronavírus e vai chegar a outros setores, como polícia, GNR, bombeiros, etc.. No esquema de ser o Exército a coordenar, os médicos estariam na retaguarda para tratar os doentes. De uma maneira geral, há mais infetados do que a contabilidade mostra.
AAL: E sobre a desejada vacina?
AB: Esse tema não é pacífico. As principais empresas a Pfizer, a MSD, a Johnson & Johnson e outras, com o mercado de vacinas próximo dos 54 mil milhões, tiveram grandes desilusões económicas com vacinas anteriores, pois quando a vacina ficava pronta, passava o surto e não havia retorno. A minha esperança é a ajuda que está a ser dada pelo governo da Noruega, a Fundação Bill & Melinda Gates e outras entidades. Sem estes apoios será difícil obter a vacina.
AAL: Quais são as suas principais preocupações além do COVID-19?
AB: Primeiro, temo que muitos doentes com outras patologias, também graves, não estejam a ser tratados em tempo real. É necessário que as estruturas de saúde façam o seu trabalho. Doenças como cancro, AVC, doenças cardíacas, por exemplo, são graves e têm de ser tratadas. Preocupa-me muito a situação de colapso económico que pode seguir-se caso o Governo, a União Europeia e todos não formos capazes de o controlar. Pode haver fome, depressão e até suicídios. Estou a ver poucas medidas de longo alcance. A lentidão da chegada de apoios às pessoas e às empresas têm sido historicamente tardios no nosso país.
AAL: Que conselhos deixaria aos vianenses?
AB: Neste período de isolamento aproveitem para refletir e meditar. Nada vai ser igual depois da pandemia. Deixem pequenas querelas que não valem nada e tenhamos todos uma atitude mais fraterna e amiga. De entreajuda e solidária. Não valemos nada se não estivermos unidos e partilharmos a nossa experiência.
AAL: Deixou público o seu telemóvel e disponibilizou-se a ajudar quem necessitasse.
AB: Sim, é o mínimo que posso fazer. Penso que já fui útil a algumas pessoas, nomeadamente alguns portugueses em países estrangeiros.