Olhar o Entrudo: do Imbolc Celta ao Enterro do Pai Velho

O homem da noite
foi quem tudo fez.
O homem da manhã não é mais
do que um escriba.
– Grety

Os rituais do carnaval são diversificados, e vão de cósmicos à inversão, e de ostentação à fertilidade.

O ciclo festivo da passagem do inverno para a primavera é denominado, também, no meio rural, de Entrudo, porém o termo mais usado é Carnaval.

“No carnaval, ninguém leva a mal”. Os signos linguísticos, Entrudo e Carnaval, estão marcados pela datação da Páscoa cristã, assim regista o calendário.

As teses referentes à origem do carnaval podem resumir-se em quatro: vegetalista, celta, greco-romana e medieval.

O Carnaval é uma celebração de todos, dos simples, dos pobres, período em que os desfavorecidos alimentam momentos de bem-estar, que vão desde a gastronomia à folia, da dança à catarse colectiva.

“No Entrudo come-se tudo, de modo especial a orelheira; haja alegria que baste; haja porco na salgadeira e vinho na caneca; o Entrudo é comilão se queres saber ao certo dá-me carne, vinho e pão; no Entrudo ruge o pote e o prato”.

O antropólogo galego Vicente Risco registou: “Acudide! ó santo entrudo / cunha xarrina de vinho; / se queredes que este santo,/ vos prepare um maridinho”.

Do Imbolc celta às festividades saturnais, passando pela celebração das festas da terra, do vinho, das florestas e das bacanais, temos um grande percurso, longo e profundo, chegando até nós reminiscências de laços culturais que fazem parte da “memória da humanidade”.

REFLEXO BRILHANTE DE CIVILIZAÇÕES

O investigador Claude Gaigne-bet no seu livro “El Carnaval” e Jacques Heers na obra “Festa dos Loucos e Carnaval”, introduzem-nos nos rituais que são “reflexo brilhante de civilizações e culturas, onde a festa não pode ser olhada, em caso algum, independente do meio social e politico em que decorre. Ela dá com efeito, testemunho de preocupações, de ambições e relações de força”.

O antropólogo Caro Baroja autor do livro “El Carnaval”, verdadeira bíblia deste ciclo festivo, escreveu que “quando o homem acreditou, de uma forma ou de outra, que a sua vida estava submetida a forças sobrenaturais, surgiu o carnaval.

O mesmo investigador assinala que o “carnaval merece respeito, estudo e análise, não só como fonte de artes plásticas, mas também musicais.

A obra “Festividades Cíclicas em Portugal”, de Ernesto Veiga de Oliveira, introduz-nos no entrudo e nos manjares cerimoniais deste período.

Não devemos omitir uma referência ao autor Frederico Cocho e seu livro “O Carnaval en Galicia”, bem como ao antropólogo José Ramom Mariño Ferro com a obra “O Entroido ou os Praceres da Carne”.

A celebração do Entrudo/Carnaval no Lindoso, Ponte da Barca, atinge o auge com rituais à volta da comemoração do Enterro do pai velho, onde se sintetizam dados culturais de um tempo longo e profundo, revelando uma continuidade cultural do Imbolc celta, do período Neolítico.

No Alto Minho, para além do Enterro do Pai Velho, acontecem, ainda, outras manifestações carnavalescas sendo de citar a “Dança dos Carpinteiros”, em Gandra, e as “Mecadas”, em Verdoeijo, ambas no concelho de Valença.

Temos necessidade de “olhar para o futuro do passado”, de que nos falava Fernando Pessoa, neste Ano Europeu do Património Cultural.

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