“Queremos deixar aos vindouros o valioso património museológico”

Mário Guimarães, engenheiro de formação, com uma pós-graduação em gestão empresarial, mestrado em engenharia humana, assumiu a função de provedor da Santa Casa da Misericórdia desde meados de 2021. 

Nesta entrevista, o antigo diretor regional Norte e adjunto do Conselho de Administração da EDP fala dos planos de futuro e da pandemia que afetou o dia a dia da Intituição.

Com várias valências, mas essencialmente a prestar serviços a idosos e crianças, a Santa Casa da Misericórdia de Viana assinalou, no ano passado, 500 anos de existência. 

A pandemia, segundo o novo provedor, revelou a capacidade de resiliência, responsabilidade e profissionalismo dos diversos colaboradores. E acredita que a Misericórdia para além do cumprimento da missão social desempenha um papel de dinamizador económico e cultural.

Como podemos caracterizar a Santa Casa da Misericórdia de Viana?

A Santa Casa da Misericórdia de Viana (SCMV) presta apoio à comunidade através de diferentes áreas, nomedamente no apoio à infância, à terceira idade, com a resposta de Lar e de Serviço de Apoio Domiciliário. Temos ainda um departamento cultural e não podemos esquecer a componente do culto.

Em relação ao apoio à infância, quais as valências?

A SCMV dispõe da creche e jardim de infância de Santiago da Barra, com 94 crianças e da creche e jardim de Nossa Senhora da Misericórdia com 141 crianças. Estas valências contam com equipas altamente motivadas para garantir que todas as crianças recebem os cuidados necessários e experiências de aprendizagem ricas e significativas.

E na resposta Lar. Quantas pessoas apoiam?

Temos 94 residentes distribuídos pelo Lar da Piedade (40) e pelo Lar de São Tiago (54). Nestas duas estruturas prestamos serviços de alojamento, alimentação, cuidados médicos e de enfermagem, e ainda proporcionamos atividades físicas e lúdicas.

E na valência de Apoio Domiciliário?

Apoiamos 30 utentes. Esta é uma resposta social constituída por uma equipa de profissionais que assegura a prestação de cuidados individualizados e personalizados no domicílio. 

Falou também do departamento cultural da Santa Casa e do culto. Quer explicar em que consistem?

A Santa Casa oferece, anualmente, à comunidade vários eventos culturais, nomeadamente concertos, exposições e conferências. Considerado Monumento Nacional desde 1910, o edifício do Hospital-Igreja da Misericórdia está disponível para visitas, assim como é também possível conhecer as salas-museus e a própria igreja. Temos ainda, para visitas, a capela de Santa Rita, que integra o extinto Recolhimento de São Tiago. A Santa Casa dispõe ainda de uma galeria, que promove anualmente 12 exposições, apoiando artistas locais e entidades/associações que procuram um espaço expositivo.

Em relação ao culto, temos celebrações eucarísticas todos os domingos, às 12h. E a nossa igreja está disponível para a realização de casamentos e batizados. No final de maio celebraremos a padroeira, com a cerimónia a ser presidida pelo Bispo da Diocese, D. João Lavrador.

Qual a agenda definida pela nova Mesa Administrativa?

A Mesa Administrativa definiu uma agenda assente em cinco eixos estratégicos: capital humano; preservação do património artístico e religioso; gestão dos ativos; novos projetos e redução de custos.

Uma das grandes prioridades da Santa Casa é a valorização do seu capital humano. Neste sentido, há um investimento grande na formação dos colaboradores e neste momento estamos a atualizar o quadro de pessoal, de modo a ajustar os recursos humanos às reais necessidades dos serviços.

E na área do património?

Nós queremos deixar às gerações vindouras o valioso património museológico da Santa Casa. Esta responsabilidade é uma grande preocupação tendo em conta que os custos de conservação e restauro destes bens são muito altos. Tem sido feito um esforço para procurar apoios. Em 2021 iniciamos a intervenção de conservação e restauro do conjunto de altares na nave da igreja da Misericórdia, num total de oito. A obra está autorizada pela Direção Regional de Cultura e foi entregue à empresa vianense OCR – Oficina de Conservação e Restauro. A intervenção terá a duração de 480 dias e está orçada em 82.400 euros. Devemos referir que esta intervenção conta com um apoio significativo da Câmara Municipal, através de um protocolo assinado em julho de 2021.

Outro eixo que é fundamental é a gestão de ativos, na medida em que procuramos rentabilizar o vasto património existente.

“Candidaturas para rentabilizar património existente”

E quais são os novos projetos?

Estamos a avaliar, por um lado, a possibilidade de apresentarmos candidaturas a projetos financiados por fundos europeus e por outro a encontrar parcerias que nos permitam encontrar soluções para rentabilizar o património existente. Apresentámos uma candidatura ao programa PARES (Programa de Alargamento da Rede de Equipamentos Sociais), que foi aprovada e vai permitir alargar a capacidade do Lar de Santiago de 54 para 63 residentes.

Estamos também a preparar uma candidatura ao Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) para melhorar a eficiência energética do Lar da Piedade e aumentar a capacidade deste de 40 para 46 pessoas.

No aspeto da redução da despesa o que pretendem fazer?

A redução de custos apresenta-se como uma prioridade da gestão da Instituição. Por exemplo, a questão da eficiência energética permite-nos diminuir os custos. Nesse sentido, instalamos painéis fotovoltaicos na Creche e Jardim da Misericórdia e no Lar de Santiago, que nos permitiram uma produção anual de 78,5MWh, representando uma poupança de 2.153 euros por ano. Esta ação não teve qualquer investimento da SCMV, porque fizemos um contrato de 120 meses, com opção de aquisição do equipamento, a qualquer momento. Acreditamos que a poupança pode chegar até aos 9.500 euros por ano. Ainda neste aspeto, apresentamos uma candidatura ao PRR para a aquisição de uma viatura elétrica para o serviço de Apoio Domiciliário, tendo sido aprovada, com um apoio de 25 mil euros.

Considera que as relações institucionais são fundamentais para a Misericórdia?

Claro que sim. O nosso objetivo é trabalhar cada vez mais em rede. Considero que o reforço institucional reveste-se de particular importância para a concretização de objetivos. Os problemas sociais com que a misericórdia se depara obrigam ao envolvimento de todas as entidades sob pena da resposta não ser a mais adequada. Nesse sentido, consideramos importante estabelecer parcerias com a Câmara Municipal, a Segurança Social, o Centro Cultural do Alto Minho, a Academia de Música, a ETAP e muitas outras. A Mesa Administrativa continuará a estar sempre próxima dos que a procuram, cumprindo a visão, missão e os valores da Instituição, fazendo face às problemáticas da atualidade.

Como chegou à Santa Casa da Misericórdia?

Por convite da antiga provedora, Dr.ª Luísa Novo Vaz. Recebi-o com muita satisfação, mas também consciente da responsabilidade. Considero que os desafios não serão fáceis, devido às circunstâncias externas que nos obrigam a repensar grande parte dos planos, processos e metas pré-estabelecidas. A pandemia teve e ainda tem bastante impacto na economia e naturalmente no normal funcionamento da nossa Instituição. Tivemos de olhar o futuro, sermos mais fortes e resilientes, com maior capacidade de inovação e novas abordagens.

“Se a SCMVC não canalizar o rendimento que obtém do património particular para as respostas sociais dificilmente as pode prestar”

Falemos da pandemia. Como foi gerir esta situação para minimizar os danos nos utentes, funcionários e nas contas da Instituição?

A vivência da pandemia foi complexa, em especial nos lares. Só foi possível enfrentá-la com o profissionalismo e grande sentido de humanidade e responsabilidade dos nossos colaboradores. Em relação aos apoios financeiros não podemos deixar de referir a Câmara Municipal e a Segurança Social, com quem mantemos e queremos continuar a manter uma relação de proximidade. Mas todas as equipas dos lares fizeram um grande trabalho para facilitar o contacto dos utentes com as famílias. Foi necessária muita criatividade para que os nossos idosos sentissem o mínimo possível o isolamento. Os nossos colaboradores foram altruístas e nada pode compensar o esforço demonstrado. 

Naturalmente, um dos nossos desafios passa pela sustentabilidade da SCMV. Em termos financeiros temos uma posição robusta, com elevados rácios de autonomia financeira e liquidez. Contudo, a pandemia teve impacto nos resultados. Em 2020 tivemos resultados negativos de 142 mil euros e em 2021 estimamos já conseguir o equilíbrio financeiro. As despesas aumentaram, sobretudo na aquisição de equipamentos de proteção individual, mas também tivemos uma diminuição de receitas porque também reduziu a procura de outros serviços.

Consideramos que a comparticipação pública atribuída pelo Estado às respostas sociais encontra-se subdimensionada, na medida em que se a SCMVC não canalizar o rendimento que obtém do património particular para as respostas sociais dificilmente as pode prestar. 

                                    

A Instituição assinalou 500 anos. Como se explica a longevidade?

Os cinco séculos de vida da SCMV são de apoio à comunidade. Ao longo da sua história foi adaptando a sua atividade às necessidades da comunidade. Até à década de 80 do séc.XX os serviços de saúde do Hospital da Misericórdia foram uma grande mais-valia. Além dos serviços hospitalares, a Santa Casa fez a gestão do Recolhimento de São Tiago, que albergava mulheres em situação de fragilidade social. Esta capacidade de adaptação é o que permite a longevidade. 

Qual a importância da SCMV para o concelho e distrito?

A Santa Casa emprega atualmente 120 colaboradores diretos e muitas empresas locais prestam serviços à Instituição. Além da missão que prestamos à sociedade, a Misericórdia é fonte de rendimentos para famílias e empresas da região, contribuindo para a dinamização da economia local.

Falou da questão cultural. O que tem sido feito para incrementar esta área?

Nos últimos dois anos, com a situação pandémica, tivemos de cancelar muita da atividade cultural. Contudo, conseguimos realizar algumas exposições e concertos e apresentamos uma publicidade digital para comemorar os 500 anos da Instituição. Com o regresso à normalidade iremos reabrir os nossos espaços museológicos, assim como reprogramar a nossa Galeria de Exposições. Pretendemos aproximar cada vez mais as escolas da nossa Instituição, promovendo visitas aos nossos espaços. Esperamos também assistir ao regresso de grupos de turistas, nacionais e internacionais. No final de setembro, ou início de outubro, organizaremos a 11.ª edição do Dia do Património das Misericórdias, em parceria com a União das Misericórdias Portuguesas.   

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