António João Rodrigues Parente da Cruz é o sucessor de Francisco Sampaio à frente da comissão executiva da Romaria da Senhora d’Agonia que, este ano, decorrerá entre 17 (6ª feira) e 20 de agosto (2ª feira). Também diretor executivo da Viana Festas – Associação Promotora das Festa da Cidade tem já uma longa experiência na organização de eventos, incluindo a “romaria das romarias”. Em entrevista ao A AURORA DO LIMA, este engenheiro que foi responsável pela logística na Browning Viana, fala-nos desse percurso e da passagem de testemunho na liderança da organização.
Como veio parar à organização da Romaria d’Agonia?
Depois de me ter aposentado, fui convidado para a comissão de festas por Defensor Moura e Francisco Cruz. Comecei a andar por aqui em 1999, portanto há já 19 anos.
É agora presidente da comissão de festas e diretor-executivo da VianaFestas. Alguma vez pensou exercer estas funções?
Não. Nunca. Ainda este ano ofereci a resistência possível a isso. Fiz sentir aos meus colegas que eu não devia ser a pessoa escolhida. Não porque não fosse capaz de resolver os assuntos, mas as minhas relações com certas pessoas não são as melhores – não admito que andem para trás e para a frente a dizer uma coisa que não é verdade. Tenho um feitio reto, gosto de dizer as coisas e assumir aquilo que digo. Fiz sentir isso aos meus colegas, mais do que uma vez. Só que eles fizeram-me uma partida: no dia em que decidiram fazer a eleição de um presidente da comissão de festas, votaram todos em mim.
E como é, agora, suceder, a Francisco Sampaio?
É sempre MUITO COMPLICADO. Ele tinha conhecimentos que eu não tenho, longe disso. Eu sou um homem de organização. Ele não se preocupava com isso, dizia ‘isso é contigo, tu é que sabes se pode ser ou não’. Ele tinha conhecimentos muito vastos e ensinava-nos todos os dias, aprendíamos com ele. Também tinha um espírito flexível. Muitas vezes dizíamos que não podíamos ir por aqui, por isto e por aquilo, e ele ‘está bem, vamos por outro lado’. Tive sempre uma relação ótima com o dr. Sampaio, agradeço muito o que aprendi com ele e tenho muita pena de estar aqui, em vez dele.
Com quanto tempo de antecedência se começa a preparar uma romaria como a da Senhora d’Agonia?
Começamos a prepará-la em novembro/dezembro. A pedir orçamentos, a idealizar o que vai ser a nova romaria, os temas, a ver datas comemorativas e coisas do género que nos vão servir para arrancar com o projeto do cortejo e coisas do género. Os meses de setembro e outubro são para arrumar a casa, dentro do possível, e, em novembro, já estamos a começar a fervilhar para o novo ano.
Quantas pessoas envolvem as Festas?
O Secretariado, que tem por funções gerir a organização destes eventos, integra quatro pessoas – eu e três colaboradoras. Depois, na comissão de festas, temos um grupo de pessoas, colegas meus, 14 ou 15, que colaboram e estão sempre prontos para nos ajudar. São incansáveis. Aliás, este ano o que fiz, quando tomei posse, foi um organigrama em que distribui funções para todos eles. Para mim é totalmente impossível saber se o fogueteiro chegou a horas, se lançou o foguete, se foi mais ou menos tempo, começa a ser muito complicado. Tenho uma pessoa encarregada das questões da pirotecnia, a quem pergunto como estão as coisas…. É isto em todos os grandes pelouros das Festas. É nessa organização que estamos a trabalhar e, para isso, tenho os meus colegas da comissão.
E, depois, o pessoal dos armazéns, da VianaFestas, das freguesias?
Isso é outra situação. Digamos que isto é a cabeça deste corpo que são as Festas. Depois, claro, sem o apoio dos armazéns da Câmara, na elaboração de carros para o cortejo e outras coisas do género (na Feira Medieval também colaboram muito connosco), as juntas de freguesia, os grupos folclóricos, que nos dão todo o apoio na parte de etnografia, etc., o costume. A Festa da Agonia envolve todo o concelho.
Mas quantas pessoas estão, então, nela implicadas?
Quando pensamos que no cortejo temos 2500 a três mil pessoas a participarem, fora as que estão por detrás que organizaram, ensaiaram, prepararam…. Se disser que temos envolvidos QUATRO MIL PESSOAS, entre participantes e organizadores, penso que não estou a exagerar.
Que números destacaria este ano?
A Mordomia na sexta-feira, dia 17, à tarde (costumava ser de manhã). O percurso é o mesmo, a grande inovação é a plataforma digital de inscrições. Qualquer pessoa, em qualquer parte do mundo, com acesso à internet, pode fazer a sua inscrição. Quem eventualmente não dominar estes mecanismos, pode continuar a ir ao Museu do Traje que lhe vai efetuar, na plataforma, a sua inscrição. Estamos sempre a tentar ‘purificar’ os trajes, a analisar mais as coisas. Para isso, há também um regulamento para ajudar os participantes a trajar e a ourar.
O Cortejo, este ano, basicamente, tem dois temas. Os 140 anos da ponte Eiffel e os 50 anos da procissão ao mar. Na parte da ponte, vamos evocar a lenda do rio Lethes, história e etnografia, trabalhos rurais nas zonas envolventes ao rio e à ponte, referir a pesca da lampreia, lembrar as sargaceiras de Anha que atravessavam as ruas da cidade, com as suas cantigas para vir apanhar sargaço à Praia Norte. É tudo uma panóplia de acontecimentos que a abertura da ponte Eiffel muito facilitou. Às pessoas que vinham à feira semanal vender os seus produtos beneficiaram com a sua inauguração e isso referido em quadros no cortejo.
Os 50 anos da procissão ao mar são, no fundo, uma homenagem ao povo da Ribeira que tem sabido manter as suas tradições, a devoção à Santa e caprichar na execução dos tapetes para ela passar. É, digamos, uma alegoria aos pescadores, ao homens que criaram a procissão ao mar. Depois temos toda aquela parte da etnografia, aqueles conjuntos, aquelas coisas todas.
Na Festa do Traje relembramos que faz 110 anos a primeira parada agrícola, hoje cortejo etnográfico, e vamos essencialmente apresentar trajes de trabalho. Desde o monte ao rio e ao mar, etc.. Os outros trajes, mais luxuosos, já estão muito vistos na mordomia e no cortejo. Vamos tentar dar-lhe um figurino diferente. Com uns filmezitos, umas entrevistas…
Quer dizer, exibição de gravações em vídeo?
Sim. Essencialmente com quatro pessoas de idade, uma do monte, outra do rio, outra… estamos a preparar. E vamos referir, novamente, os 50 anos da Procissão ao Mar, mostrando os trajes da Ribeira, um bocadinho de marchas da Ribeira, coisas parecidas, mas tentar fazer uma coisa diferente.
Para a Festa do Traje será obrigatório levantar o bilhete, que é gratuito, na bilheteira do Centro Cultural, onde decorre no domingo à noite.
Como vianense que acompanha há já muitas dezenas de anos a romaria, quais as principais notas a nível da sua evolução ao longo os tempos?
Recordo-me de ser miúdo e a romaria ser uma coisa essencialmente local, gente das aldeias que vinha à cidade, à sua romaria. Hoje isto está de tal modo espalhado que temos gente de todos os lados. Turistas, romeiros, junta-se tudo aí. Todos sabemos o que é o mês de agosto em Viana. Sobretudo nos últimos anos, talvez há umas duas dezenas, começou a incrementar–se e a verificar-se muita mais gente.
Numa romaria desta dimensão popular e envolvendo tanta gente, da cidade e de todas as aldeias do concelho, não seria de equacionar uma candidatura a PATRIMÓNIO IMATERIAL DA HUMANIDADE?
Já há quem tenha pensado nisso. Estamos a equacionar essa hipótese, uma vez que, por exemplo, em termos de religião, já esta tem o reconhecimento e Interesse Religioso. Portanto, não sou um especialista nisso, mas sei que se tem falado já nisso. Há uma série de etapas que é preciso ultrapassar. Era um dos sonhos do dr. Francisco Sampaio, mas agora não pode dar a sua contribuição.Nada me espanta se dermos um salto nesse sentido e se avançarmos para a candidatura.
E esse salto poderá ser quando?
Penso que não poderá estar muito longe. Nos próximos três a quatro anos é capaz de se começar a falar no assunto.
A romaria custa mais de meio milhão de euros, o mesmo que no ano passado?
O nosso orçamento passa de 600 MIL e a autarquia tem previstos 300 mil euros. Isto é preciso controlar muitas despesas porque se não tivermos essa precaução desde o início, quando dermos por ela as coisas começaram a fugir. Eu e a minha equipa temos conseguido isso e uma coisa que me alegra é poder dizer que mais de 50 por cento do custo da festa é angariado por nós.
Este romaria é um abono de família para muitas empresas, pela repercussão que tem no tecido económico?
Custa-me ouvir, muitas vezes, dizerem que a Romaria da Agonia não nos traz nada. A contribuição dos comerciantes é muito exígua. Posso-lhe dizer só isso. Há uns 15 anos, sensivelmente, havia até um peditório pela cidade, com as casas comerciais, etc.. Quem se encarregava era a associação empresarial (AEVC). O resultado desse peditório era tão exíguo que chegámos à conclusão de que não valia a pena andar a perder tempo de porta em porta para angariar meia dúzia de euros.
Recordo-me do comentário, uma vez, de um presidente de Junta, numa reunião, salvo erro na Câmara, em que se falou disso. Ele disse que na sua freguesia (aldeia) arranjo muito mais do que isso.
Recordo-me de ser miúdo e haver peditório, uma comissão com uma lista, em que os meus pais também contribuíam.
Ainda a propósito de contas: se um munícipe quiser vê-las, é fácil?
Elas vão para a Assembleia Municipal. Sabemos que, muitas vezes, a oposição as pede e são facultadas.
Se um munícipe quiser aceder a elas?
Até agora, nunca se pôs essa questão…
Como é seu dia a dia nestas dias mais de afogadilho?
Pois… é aqui… também não sou remunerado porque não quero. Foi-me posta essa possibilidade, recusei, disse que queria era ajudar a minha terra. Se quisessem pagar, ia-me embora. Até perco dinheiro, gasto gasolina, telefones à minha conta. Mas é a maneira de dizer que gosto de Viana.