Lancei um barquinho ao mar e deixei-o vogar, vogar.
Mas ganhando confiança nesse mar de aparente bonança logo começou a s’ afastar.
E um barquinho feito de casca de pinheiro, enegrecida,
sem valor, desprendida, que a velhice fez secar. Resolvi deitá-lo ao mar para não desperdiçar
essa matéria banida.
Fiz-lhe uma vela com o lenço branco da minha saudade
e deixei-o ganhar velocidade nesse mar incerto e extenso
ao qual, como outros, pertenço. Eu queria m’ expatriar
rara o outro lado do mar! A quilha foi fabricada
com o volume das minhas mágoas
que o prendia: às águas amortecend’o seu baloiçar. Com a rota traçada
ele continuava a avançar.
Mas o barquinho era leve para enfrentar os oceanos; então, como lastro ele teve
- peso dos meus enganos que no cais da ilusão
esperavam embarcação. O barquinho s’ afastava
- a multidão s’amontoava no cais, a vê-lo flutuar, decidido, sereninho,
levando a rota do Minho para em Viana atracar.
Perdi o meu barco de vista
para além da linha do horizonte,
- sem poder seguir lhe a pista porqu’estava já distante, subi ao mais alto ponto
- fiquei assaz espantado… outros barquinhos ao lado do meu, também seguiam a rota das mesmas paixões
- como o meu, lá iam d’esperança carregados, ornados das mesmas ilusões.
Agora, contando os dias, vou esperand’o seu regresso
- a Neptuno eu peço
para o guiar na viagem. E s’acaso ele voltar
que me traga lá da terra
um pouco da beleza qu’ela encerra: a fragrância do rosmaninho,
do eucalipto e as coisas mais que fazem calar os meus ais. Que me diga se presentemente tudo é lindo como antigamente!
Eugénio Monteverde