É o slogan mais utilizado quando esse período festivo se aproxima.
Especialistas na matéria escreveram que a origem do carnaval e do seu nome era desconhecido e que continua a ser polémica. O que se sabe, o carnaval, em definição genérica é uma festa popular colectiva que foi transmitida oralmente através dos séculos, como herança das festas pagãs. Segundo alguns estudiosos, o carnaval era uma comemoração com raízes nalguma festa primitiva, de carácter orgíaco, realizada em honra do ressurgimento da Primavera. Na antiguidade, em certos rituais [10 mil a.C.], homens e mulheres pintavam o rosto e o corpo deixando-se enlevar pela dança, pela festa e pela embriaguez. Muitos outros autores acreditavam que o carnaval se tenha iniciado nas alegres festas do Egipto. É sabido que os egípcios festejavam o culto a Ísis há dois mil anos a.C. Em Roma, realizavam-se danças em homenagem a Deus Pã – as chamadas Lupercais – e a Baco – as Bacanais.
Depois deste pequeno intróito, as comemorações do carnaval no nosso burgo, no meu tempo, cingiam-se, quase exclusivamente, aos bailaricos e a foliões deambulando mascarados pelas ruas da cidade, com os seus excessos, entretendo as pessoas. Na década de sessenta e princípios da de setenta, do século findo, o País estava moribundo, amordaçado e o povo triste, psicologicamente abatido. A guerra fratricida no Ultramar, forçada pelo poder, desnecessária, para o povo, sem justificação plausível, era o açougue da juventude e o desespero de quem por cá ficava. O ambiente nacional não era propício a grandes folias mas, no entanto, não se deixava passar a quadra do Entrudo, sem uns bailaricos comemorativos, pondo de parte, por alguns dias, as mágoas e as frustrações. Aqui, no meio citadino, as sessões dançantes estavam divididas por classes ou castas: a da elite, gente fina, frequentadora das assembleias reservadas a sócios, aristocratas, políticos da situação, pseudo-nobres ou convencidos; a casta dos funcionários e afins, bancários, professores, militares, etc., etc., e a casta denominada da “chunga”, a mais apetecível e divertida. A malta na primeira não entrava, era muito “selecta” e tinha jóia de acesso. Começávamos pela segunda e, depois da meia-noite, acabávamos na terceira. Então, aí sim, poderíamos dizer que gozávamos um carnaval em cheio! Eram permitidas máscaras ou dominós nestas duas últimas.
O Julinho, folgazão por natureza, era o nosso comparsa mais ferrinho dos bailes de carnaval. Mas não os frequentava, como dizer, de corpo bem feito ou de fatinho. Alugava um dominó à maneira e, assim “artilhado”, ia sozinho, para não ser identificado. Saltava de um baile para o outro e gabava-se de que nunca levou um tampo de qualquer garota. Todas gostavam de dançar com ele, mesmo sem saberem de quem se tratava, elogiando a sua maneira de dançar muito característica, aos saltinhos e levezinha. “Conduzia bem”, segundo as dançantes. E na entrada da sala de baile não precisava de se identificar ao porteiro, facultava-lhe logo permissão de acesso. Gabarolava-se disto em toda a parte e a toda a gente. E assim foi acontecendo noutros carnavais mais à frente.
Num determinado ano o grupo habitual juntou-se para ir ao baile dos “carnavais” ali ao redor. Demos por falta do Julinho porque, como era habitual, não existia nenhum dominó por ali ou outro qualquer disfarce na fisionomia do corpo sui géneris do nosso companheiro. No dia seguinte, encontramo-lo sentado na esplanada do café, solitário, meditativo e com um olhar distante. Fizemos-lhe a pergunta:
— Ontem não foste aos bailes como do costume, Julinho?
— Não fui e nunca mais vou! respondeu com enfado. — Sinto-me frustrado! Afinal toda a gente me conhecia! Andei estes anos todos a fazer de parvo! Nem os fiscais à entrada da sala me pediam a identificação! Não sei porquê!?
— Pois conheciam, Julinho – respondeu-lhe um colega — Por ventura, já mediste o tamanho do tacão da bota que calças no pé esquerdo?