As nossas Festas: do elogio ao reparo

Não há eventos sem instantes bons e menos bons. Sempre foi assim, e assim continuará a ser no futuro. E as Festas d’Agonia também não fogem à regra. Daí que, objetivamente importante, no cômputo geral, em qualquer balanço que se possa fazer o resultado seja considerado positivo. E aqui temos que ser afirmativos, já que não é por acaso que a nossa Romaria está considerada como a Rainha das Romarias. Praticamente desde a sua existência (assumida por Carta Régia em 1772), que Viana é “assaltada” por um número de forasteiros, sempre em crescendo, que a cidade até tem dificuldade em acolher, o que vem provar que não é por insuficiências constatadas em alguns números do programa que o público presente fica desagradado. Mas Viana tem responsabilidades que não pode descartar. Primeiro pelo respeito de que são merecedores todos os que ao longo de décadas trabalharam afincadamente para que as Festas crescessem em qualidade e brio e, acima de tudo porque não podemos defraudar os muitos milhares de visitantes (não sabemos se mais se menos do milhão apregoado) que acorrem à nossa cidade, na expectativa de observarem bons festejos na maior Romaria do país.

Mas deixemos as generalidades e observemos alguns aspetos que devem merecer maior ou menor aplauso. Este ano as Festas apresentaram sensíveis melhoras em alguns números e menor brilho em outros nos quais não era esperado. O Cortejo Etnográfico mostrou evolução. Quem, debaixo do sol escaldante (para quando a numeração dos bilhetes e das bancadas para poder evitar horas de espera?), teve a paciência de ler o guião do cortejo logo concluiu que a rotina foi algo sacudida. A começar no próprio documento, suficientemente estruturado no plano informativo e em escrita bem arejada e fluída. O cortejo mostrou-se bem pensado e com articulação que não sendo perfeita também não merece grandes críticas. O modelo com enquadramento de uma parte histórica, contemplando um setor com passado na vida da cidade, como é o monte de Santa Luzia, e uma segunda parte com a Parada Agrícola, onde se representou o mar, o rio, o monte, o campo, o vinho e mais um conjunto de números que definem a nossa identidade, exibiu-se bem e mostrou grandeza. A ideia que fica é que o estilo é para continuar, não descuidando melhorias. Há quem não goste do chamado caldeirão, mas este justifica-se plenamente e remata bem o cortejo, separado pela banda de música. Ali está verdadeiramente o povo, em alegria contagiante, sem alinhamentos e não obedecendo a exigências de qualquer ordem.

Na mesma linha tivemos a Festa do Traje, que seguiu um figurino já ensaiado em anos anteriores, na base de temáticas próprias, mas agora com melhorias. Teve aspetos que não deveria ter (não é de bom tom realçar o que bom nunca foi, por repetição exaustiva), mas teve méritos que não podem ser escamoteados. E mostrou bem que, com criatividade se pode apresentar em cada ano uma Festa do Traje que não deslustre no âmbito do programa das Festas, justificando que não quer ser o número pobre da Romaria. Foi bem pensado fazer a história da Festa do Traje, ouvindo gentes que outrora foram figurantes da mesma. Há, por outro lado, que divulgar a Festa do Traje como um número nobre das Festas, porque se havia uma mobilização abundante de público quando esta tinha lugar no estádio do SCV ou no Castelo de Santiago da Barra, assentando num figurino estereotipado, mal se compreende a pouca gente que atrai para o Centro Cultural para observar um espetáculo de características bem diferentes. É tudo uma questão de imaginação.

Não faltou gente a criticar, com algum ruído, a ausência de música no decorrer da Serenata. Em 1948 no centésimo aniversário da elevação de Viana a cidade, as Festas, grandiosas, tiveram não uma, mas duas grandes serenatas, evidenciando a importância e excelência que este número tem no contexto dos festejos. A Serenata é o remate grandioso das nossas grandiosas Festas. E tantas vezes elas, em boa medida, se avaliaram pela maior ou menor dimensão da Serenata. A introdução da música no decorrer do fogo é relativamente recente, mas “adocicou” a iniciativa e por isso foi bem acolhida pelo público. Não lhe dar continuidade foi um erro.

Brilhante continua a ser o fabrico dos tapetes na Ribeira, a mobilizar público que aquele espaço já comporta mal. O designer Rui Carvalho foi convidado a responsabilizar-se pela criação do desenho e acompanhamento da decoração da Rua Gois Pinto. Tratou-se de uma ideia feliz. Era bom que o gesto se repetisse e se alargasse a outros artistas. Isto sem deixar de envolver as gentes das artérias onde os tapetes se fazem, porque é ai que mora a sensibilidade do que bem se pretende, em função de vivências próprias. Os tapetes também são uma componente da parte religiosa das Festas e há que reconhecer, como sempre aqui se fez referência, que esta vertente, que toca bem fundo os crentes e amantes da fé, dificilmente perde brilho. Este ano esta evidência foi mais uma vez bem patente.
Agora há que começar a pensar nas Festas do próximo ano.

Refletir sobre o que mais uma vez não correu bem e como se pode evitar que tal não aconteça no futuro, e trabalhar para conseguir um programa melhorado com novos números e reforço dos números que são históricos e por isso obrigatórios. Como remate, fica o desejo de que por sorte ou decisão administrativa as Festas do próximo ano sejam contempladas com uma cartaz prenhe de alegria contagiante, de cores festivas e passível de ser levado a toda a parte como o cartaz bem representativo das maiores Festas do país.

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