2 – A Igreja de Nossa Senhora de Monserrate

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Respeitamos a pontualidade combinada. Chegamos ao Largo 9 de Abril (e não 5 de abril, como por lapso a semana passada aqui se escreveu) eram 10 horas. À distância, notamos que, munido de papeis, Joaquim Terroso dava e contava passos, para norte e sul, para nascente e poente. A primeira ideia que nos ocorreu foi a de que estava a simular uma marcha militar, tal como tantas vezes aconteceu naquele largo. “Um dois, um dois três”, dissemos reinando quando dele nos abeiramos.

– Não, não se trata de uma marcha orientada por um militar de patente. Mas apenas de recriar, com alguma orientação, o espaço onde se localizava a igreja que, injustificadamente, aqui se demoliu, para tristeza de todos os vianenses, mesmo os menos religiosos. Sabe, aqui, na revista “Lusa” de que me fiz acompanhar, José Caldas um dos nossos melhores escritores, e cronista regular do nosso Aurora enquanto vivo, conta a história sombria da construção e demolição desta igreja de religiosidade sentida.

Observamos a “Lusa” em conjunto. Lemos, e relemos para melhor compreendermos o Ser Humano, tantas vezes iníquo. Caldas descreve com indignação o que aconteceu. Segundo ele, a muita fé, particularmente de mareantes e marinheiros, viajados que eram por terras de Aragão, levou-os, com a cumplicidade das Beatas do Recolhimento de S. Thiago (“mesmo aqui ao lado”, diz-nos Terroso) a criar, em 1560, um pequeno altar para nele “alçarem dignamente a Senhora de Monserrate, Santa de sua devoção”, a quem recorriam regularmente para suas preces. Dado o crescimento de devotos, que nunca parou de medrar, à data de 1600, 40 anos decorridos, entenderam os moradores da vila de Viana que era tempo de criar uma ermida, capela, ou igreja para alojar a Senhora. Com entusiasmo ao rubro, logo constituíram uma comissão para o efeito, composta por Gonçalo Esteves e Melchior Alvarez da Costa, mercadores, e ainda António Rodrigues, barbeiro, e Simão Alvarez, confeiteiro.

Da tarefa a que meteu ombros esta comissão de 4 generosos cidadãos, pedinchando por toda a vila, avultados resultados financeiros aconteceram, porque nestas coisas da religião, para que o acolhimento no céu não falte, ninguém quer ficar de fora. Ultrapassado que estava o mais difícil, só havia que encontrar o local mais conveniente para a construção de um edifício que satisfizesse todos os requisitos do alojamento da Santa e da boa prática do culto religioso a tantos vianenses magnânimos. Pensou-se então, diz José Caldas “nuns chãos fora dos muros da vila, na parte mais ocidental dela, confinantes pelo Norte com a boca do caminho de Santa Luzia e pelo poente com o pequeno rocio (logradouro público) que dizia com a cerca ou cerrado das Beatas de S. Thiago, tudo compreendido no arrabalde da Portela”, portanto, “neste espaço em que nos encontramos”, dizia-nos emocionado o nosso amigo Terroso, como que viajando ao ano de 1600.

De imediato, os mais entendidos nesta coisa da construção, com a presença da Irmandade padroeira, trataram de riscar nos chãos os limites para o edifício do seu sonho, “com 120 palmos de comprido na linha do norte ao sul e 45 de largo, andados do nascente ao poente”, citando Caldas. Agora entendemos a marcha a que se dedicava o Nosso Joaquim Terroso quando nos encontramos há pouco.

“O tempo voa e assim nunca mais chegamos a Santa Luzia”, diz-nos o Senhor Joaquim, enquanto, curiosos, consultávamos a Lusa. – E o pior é que o desfastio cresce. Lá teremos que adiar de novo a viagem, rumo ao monte. Fica para a semana que vem.

–Então até lá, Senhor Joaquim, mas não se esqueça que ainda temos que saber como a igreja foi vilmente abatida. Mas tenha em conta de transportar consigo o nº 52 da “Lusa”, de dezembro de 1919, porque aí tudo está relatado. – Sim, sim, com todo o gosto. É para a semana.

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