Subíamos a rua General Humberto Delgado. Joaquim Terroso, como na semana anterior tinha manifestado, não abdicava de visitar o alto-relevo do “General sem Medo”. Notámos que as pernas já não o ajudavam, apesar de não querer dar parte de fraco. Próximo da peça escultórica ensaiou um gesto de continência à boa maneira militar. Depois, curvou-se sentidamente e logo se afastou para continuarmos o nosso percurso, previamente estabelecido. Não resistimos a dizer-lhe que Humberto Delgado tinha sido um fiel servidor do Estado Novo, antes de ser oposicionista.
– Nunca desistam de ver o Ser Humano a trilhar o caminho do bem. Nunca é tarde para fazer dum homem insensível e preocupado consigo próprio num homem de causas. E de forma simples, simpática e pedagógica, convidou-nos a não parar.
Mas paramos no andar superior do Shopping, para que pudesse mirar a bonita Avenida dos Combatentes.
– Meu pai recordava-se da sua abertura, em 1917. Disso nos falava amiúde. Ficou aberta ao trânsito, com piso e passeio para peões em 1920.
– É verdade Senhor Joaquim… mirou-nos e disse: “tratem-me por amigo Joaquim. Sinto-me melhor”. Anuímos sorridentes e continuamos: sabe, há pouco mais de dois anos, mais concretamente na nossa edição nº 16 de 09/05/2019, escrevemos sobre uma conferência realizada no Auditório do IPVC, onde se falou desta obra monumental.
– Sim!? Não me lembro de ter lido. Então conte-me.
– Vamos a isso, porque assim abreviamo-nos e podemos prosseguir caminho, respondemos.
Um ano antes da chegada do comboio a Viana, que se verificou a 30 de junho de 1878, já se pensava na construção de uma via fluída que desse acesso ao Porto de Mar, que, apesar de bem longe dos tempos de grande porto nacional que tinha sido, se apresentava ainda como instrumento para o relançamento da economia da região. Por isso, o assunto foi para debate ainda antes da ferrovia cá chegar. Mas como é próprio dos vianenses, o assunto foi-se arrastando, tanto mais porque nada pacífico, uma vez que havia várias casas para demolir e novas artérias para abrir, para além da avenida principal.
Foram quatro décadas de indefinições, mas a obra arrancou mesmo. Aprovada pelo governo em janeiro de 1917, iniciou-se de imediato e, ainda nesse ano, mesmo em terra batida, nela circularam pessoas e carros. A pavimentação da via e dos passeios só ficou pronta em 1920, ano em que se iniciaram as primeiras construções, com referência para o edifício da Cruz Vermelha. Em 1926, já era possível conviver com árvores por onde circulavam os transeuntes.
Para fazer vingar este projeto, foi preciso eliminar quatro ruas (Cabaças, Gonçalo Afonso, Fornos e S. João), mais um largo, e demolir 80 fogos, deixando sem teto muitos moradores, que se pensou em abrigá-los em bairro social a construir no Cais-Novo, projeto não concretizado. A partir daqui, Viana tinha mais um instrumento urbano para se modernizar e evoluir economicamente. A modernização no plano urbanístico foi acontecendo, mas no plano económico os resultados foram bem mais lentos, como ainda hoje podemos constatar.
Temos dito Senhor Joaquim. Até para a semana. Acenou, e partiu feliz. Via-se-lhe no rosto.