A primeira vez que tomei café foi na máquina do corredor do liceu de Santa Maria Maior. No intervalo da manhã, — mas a memória já não me acode e permaneço na dúvida entre os vinte a trinta minutos livres — custava menos de uma moeda de cinquenta cêntimos.

Estávamos em grupo, como era habitual, timidamente explorando os corredores de um liceu, como “meninos grandes”, no primeiro período do décimo ano, procurando, nalgum recanto, a confiança.

Havia uma inocência clara à flor da pele. Queríamos parecer mais velhos do que o que realmente éramos. Mudámos o guarda-fatos inteiro, antes de abarcar nas primeiras semanas de aulas, o gosto musical e até alguns dialetos. Coisas que mais tarde se revelaram fúteis e, vencidos pelo cansaço, tornávamo-nos a nós mesmos, com os próprios gostos, sem olhar a terceiros.

“vamos beber um café!”
“nunca bebi um café”
“eu bebi uma vez, vais gostar, tem um sabor forte”, havia sempre alguém que já tinha experimentado (dizia), ou mais avançado que os outros (e isto repetia-se em quase tudo na vida, nas apostas do placard, nos cigarros, no álcool, nas miúdas, tudo… adolescentes precoces, ou de língua grande).

Metemos duas moedas, à vez, e tiramos os expressos, um para cada um, a esfumar-se dentro daquele copito de plástico. Eventualmente carreguei nalgum botão e bebi-o sem açúcar. Detestei. Insisti, porque havia alguma razão para todos os adultos viveram à base da cafeína.

Hoje, adulto, entendo a razão, só não compreendo em que momento me “caiu a ficha” — terá sido ao terceiro, ao quarto, ao vigésimo café? Enfim, algures entre a adolescência e aquele corredor do liceu, cedeu-se no meu palato o prazer face ao café.

Márcio Luís Lima