A presença pioneira dos portugueses na Ásia no séc. XVI e XVII, catalisadora dos primeiros contactos entre a Europa e o Oriente, apresenta ainda nos dias de hoje marcas vivas dessa Era dos Descobrimentos.
É o caso de Malaca, uma cidade e porto da Malásia, uma nação situada no sudeste asiático, que preserva desde a centúria quinhentista, época em que por ação de Afonso de Albuquerque, vice-rei da Índia nomeado por D. Manuel, o então sultanato se tornou numa base estratégica para a expansão portuguesa nas Índias Orientais, um singular legado luso.
Simultaneamente, Malaca tornou-se no mesmo período histórico, por ação de São Francisco Xavier, jesuíta e apóstolo do Oriente, um importante centro da atividade missionária, contexto que se alteraria a partir de 1641, ano em que a antiga possessão portuguesa caiu nas mãos dos holandeses.
A história de Malaca, onde ainda hoje vivem cerca de mil a dois mil descendentes de portugueses em mais de uma centena de casas, no chamado bairro português, concorreu para que a cidade malaia tenha sido, em 2008, classificada como património mundial da UNESCO. Distinção que levou, nesse ano, o então Presidente do Centro Nacional de Cultura, Guilherme d’Oliveira Martins, a asseverar que Malaca merecia ser classificada como património mundial da UNESCO por três razões: “pelo valor memorialístico, pela monumentalidade (em especial o que resta do forte português e a célebre porta que mantém a designação de “A Famosa”) e pela ligação entre o património histórico e o diálogo intercultural com a língua portuguesa (o papiar cristan)”.
A herança portuguesa em Malaca é desde o início da década de 2010 singularmente preservada e difundida pelo Portuguese Settlement Heritage Museum (Museu da Herança do Povoado Português). Um espaço museológico, situado no bairro português, que graças a lusodescendentes como Christopher De Mello e Jerry Alcântara, conta com um espólio de largas centenas de peças, objetos e coleções pessoais, como fotografias, carpetes, quadros, pratos e uma réplica da nau “Flor de la Mar” (Flor do Mar), que naufragou em 1511 no estreito de Malaca, com um imenso tesouro, que nunca foi encontrado.
Como evoca António de Abreu Freire, investigador do CLEPUL – Centro de Literaturas e Culturas Lusófonas e Europeias da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, em Portugueses pelo Oriente, são “muitos os testemunhos da presença portuguesa pelo Oriente, que aparece hoje aos olhos dos estudiosos como um projeto desmedido de um povo pequeno e distante. Movido por uma utopia arrasadora, o povo português ultrapassou imprevistos e obstáculos que a natureza e os adversários armavam. Feita de coragem e de utopia, de conhecimento e de ambição, a expansão portuguesa pelo Oriente foi uma das maiores proezas civilizacionais da humanidade”.