Tenho lido com bastante interesse as crónicas habituais, em destaque na última página, do ex-autarca local Carlos Branco Morais, e, sobre a de 26/05/22, não resisto a fazer um breve comentário, se me for concedido tal direito.
O autarca de Viana do Alentejo referido nessa peça ter-se-á pronunciado sobre a sua terra nos termos em que o fez, “Viana do Castelo”, com toda a naturalidade, e não por lapso ou momentânea força de expressão: é a convicção sincera daquela boa gente alentejana. Quando lá estive, há vários anos, a primeira coisa que me disseram, precisamente à porta do Castelo, quando me apresentei como natural da Viana cidade, foi “vocês lá nem têm castelo nenhum”!
Mas o que motiva este meu escrito é mais a alusão aos autarcas de 1848 que continuaram a designar por “Cidade de Viana” a Vila então distinguida, alegadamente, como forma de repúdio da alteração do nome ancestral do nosso burgo sem o consentimento dos vianenses coevos; vem ali esse registo a seguir à informação de que em 1992 o Presidente da República ofereceu ao Presidente da Câmara de Viana do Castelo uma colecção de medalhas dos castelos portugueses, não se ficando bem a saber se o Castelo da nossa Viana vinha incluído no lote. É neste preciso contexto que eu quero meter a foice.
Não fiquei com a certeza de que a atitude dos autarcas do tempo da Monarquia louvada neste artigo — de franca e deliberada hostilidade à Rainha — é um facto histórico incontroverso, assim documentado, ou apenas a interpretação dum inocente acto de inércia administrativa pelo articulista em foco. Mas, a meu juízo, uma coisa é certa: os autarcas de 1848 tinham todo o direito a, dessa forma, manifestarem a sua indignação, justamente, pela falta de respeito pela vontade popular, pela não democraticidade, patente naquela resolução régia.
Tal, porém, não poderá afirmar-se, muito pelo contrário, dos autarcas de 1993, mormente, presumo, daquele mesmo Presidente em funções em 1992, que no dia 13 de março, em homenagem a um notável artista vianês, fizeram colocar na Praça da República, na fachada da antiga Casa Couto Viana, uma placa em granito na qual se identificam institucionalmente como a “Câmara Municipal de Viana”. Isso, sim, é que foi um vero ultraje, impune, à Cidadania vianense.
Na verdade, apesar da larga cópia de informação historiográfica que nos debita, com uma precisão de causar inveja à Wikipédia, o actual articulista Carlos B. Morais não torna claro se, naquele último quartel do século XIX, alguém terá feito saber à monarca reinante, D. Maria II (que, dez anos antes, em 20 de Março de 1838, jurara e promulgara uma Constituição política proclamando que “o Governo da Nação Portuguesa é Monárquico”), que o povo de Viana não queria, ou não gostaria, do aposto onomástico que ela, digamos assim, se preparava para lhes impor na denominação oficial da sua vila em via de promoção a cidade.
Já, porém, o autarca republicano Carlos B. Morais, naquela última década do século XX, não tinha a menor dúvida de que então, tal como hoje, o governo local competia à Câmara Municipal de Viana do Castelo (meu sublinhado), pelo que — sob a égide duma Constituição que, logo no artigo 1.º, consagra Portugal como “uma República soberana, baseada na dignidade da pessoa humana e na vontade popular” (meu sublinhado) — não podia, nem devia, ignorar que direito nenhum assistia ao seu Executivo para pôr dessarte em prática, inopinadamente, um mero desiderato pessoal, mesmo que alargado a um grupo, como foi aquele seu, famoso, da “Viana sem Castelo”.
Concluo afirmando que, se houvesse um referendo local sobre essa questão, eu votaria sem hesitar pela alteração do nome do nosso município para, simplesmente, Viana: as gerações futuras, ao que creio, dar-nos-iam razão. Mas isso agora é secundário. O que realmente importa, aquilo que pretendo assinalar, é antes o facto incrível, tristíssimo, de, desde há quase trinta anos, nenhuma Edilidade vianesa se ter disposto a gastar umas coroas (mesmo que europeias), até para desagravo da desvalida Rainha Senhora D. Maria, a repor a verdade histórica no bojo do centro urbano, na chamada Praça da República.
Carlos Fidalguinho