O poeta Guerra Junqueiro nasceu a 15 Setembro 1850, em Freixo de Espada à Cinta, morreu a 7 Julho de 1923 e está depositado no Panteão Nacional.
Literariamente opôs-se ao Romantismo idealizado e sentimental, procurando, com as suas poesias, ter um papel interventivo na sociedade, sendo considerado o maior poeta social português do séc. XIX, combatendo as fontes das desigualdades sociais, que considerou serem a monarquia e, numa primeira fase, igreja. Foi também político, eleito deputado pelo Partido Progressista, tendo depois alinhado pelos ideais republicanos.
Guerra Junqueiro tem uma longa e muito próxima relação com a cidade de Viana do Castelo, uma vez que foi nomeado secretário do Governo Civil (o governador era o conselheiro Rocha Páris) em 19 junho de 1879 e aqui viveu mais de uma década, primeiro na rua Manuel Espregueira e, depois, na rua da Bandeira, na casa dos Boto Calheiro (hoje é a galeria comercial do número com o nº 124)
Foi também em Viana que se casou, na Igreja Matriz, a 10 de Janeiro de 1880, com Filomena Augusta da Silva Neves e aqui nasceram as suas filhas Maria Isabel (11 Novembro 1880) e Júlia (27 Janeiro 1882).
Foi colaborador d’A Aurora do Lima, jornal também ligado ao partido Progressista, e também da revista Pero Galego, em 1882. António Pimenta de Castro conta no seu livro Guerra Junqueiro a sua vida em Viana do Castelo (2020) que “Apesar de Guerra Junqueiro ser progressista, a maioria da clientela da Casa Havaneza era, maioritariamente, regeneradora, o que não impediu o são convívio diário do poeta com a tertúlia da Havaneza”. Era, portanto, um homem envolvido na vida política e social da cidade.
Foi também em Viana que iniciou a sua colecção de antiguidades – hoje expostas na Casa-Museu Guerra Junqueiro, no Porto, e “contagiou” com o seu gosto o Dr Luís Augusto Oliveira, cuja colecção veio a ser doada ao Museu de Artes Decorativas de Viana, onde hoje pode ser vista.
Foi neste período que escreveu as suas obras mais contundentes, nomeadamente o anticlerical A Velhice do Padre Eterno (1885), o Finis Patriae e a Marcha do Ódio (ambos de 1891), com que reagiu ao ultimatum inglês sobre o mapa cor de rosa, criticando a monarquia, que considerou os principais causadores da decadência política, económica e moral do país.
Junqueiro fez mesmo questão de datar e localizar em Viana três dos seus poemas: a Lágrima, 25 Março 1888, A Moleirinha, de Novembro de 1888 e O Caçador Simão, de 8 Abril 1890.
A Moleirinha é um poema que integra o livro Os Simples e refere-se a uma velha moleirinha que vem à cidade vender a farinha do seu moinho: “Pela estrada plana, toc, toc, toc / Guia o jumentinho uma velhinha errante / Como vão ligeiros, ambos a reboque / Antes que anoiteça, toc, toc, toc / A velhinha atrás, o jumentinho adiante” .
É provável que a estrada do poema seja a da Areosa, por ser terra de muitos moinhos – em meados do século XX estavam cadastrados mais de 50, cuja farinha alimentava a cidade.
O poeta descreve ainda um pouco da vida desta moleira: “Toc, toc, é tarde, moleirinha santa! / Nascem as estrelas, vivas, em cardume… / Toc, toc, toc e quando o galo canta / Logo a moleirinha, toc, se levanta, / P´ra vestir os netos, p’ra acender o lume”.
A poesia glorifica também esta vida dura de trabalho: “Toc, toc, toc, e a moleirinha antiga / toda, toda branca, vai n’uma frescata… / Foi enfarinhada, sorridente amiga, / Pela mó da azenha com farinha triga / pelos anjos loiros com luar de prata”.
O autor diz sobre o livro Os Simples que “é muito mais uma auto biografia psicológica que uma série de quadros campestres e bucólicos. (…) A Moleirinha é minhota”.
O poema ao mesmo tempo que mostra a forte ligação de Junqueiro ao ambiente minhoto, é mais um contributo para a idealização da vida rural e do Minho em geral, como espaço de pureza idílica, onde o esforço do trabalho é glorificado pelos seus habitantes, que fazia escola desde meados do século XIX, que via no Minho uma espécie de paraíso na terra, numa ideia que ainda hoje podemos ler em textos menos inspirados que continuam a repetir esta ideia romântica.
João Alpuim Botelho
N.R.: O Autor não acompanha o novo acordo ortográfico