Homem, tenha calma! Acredite mesmo que, aos noventa anos, é possível ter, saborear e mostrar alegria. Basta ler o que se segue e terá o caminho facilitado.
A Bíblia explica o modo como Deus criou o mundo a cores garridas e não só a preto e branco; como criou o arco-íris com as suas gritantes e variegadas cores, só «bonitchinhas e bonitchinhas a valer». E como criou dois seres humanos, corporalmente diferenciados, mas tão bem parecidos que, não confundidos, mas grandemente surpreendidos, se viram despidos; e quando assim se viram, certamente sorriram, se abraçaram, abrasaram, amaram e muito se alegraram. E foi mesmo uma «belezinha a brasileira» enquanto não perderam a chaveta da cuca, diante de uma maçã bolbosa naturalmente apetitosa. Quando quiseram ser iguais a Deus e se estenderam a todo o pano a consciência gritou, a indefinição imperou e a voz de Deus ecoou. Vindo a condenatória repreensão, felizmente, veio repassada de redentora solução: o Verbo Eterno, remediando a desordem acontecida, partiu definitivamente para o mesmo ponto de partida a que eu chamo a casa do Pai. Assim aconteceu de facto; mas, antes da viagem final e num gesto de infinda generosidade, Jesus Cristo ofereceu aos homens o Espírito Santificador para que a alegria deles fosse completa. Exatamente: «COMPLETA»
Ah!…. Completa… Mas as doenças e desavenças, as securas e agruras, as velhices e perrices, as chatices e peguilhices, as encrenquices e piolhices, as manhosices e burrices… pois é!… Tudo isso é verdade. Mas o cristão vianense, acompanhado da serenidade da sua fé, tem a maior sorte do mundo no Monte de Santa Luzia onde o Coração de Cristo se manifesta visivelmente, como visivelmente se manifestou aos nossos antepassados, nos tempos fatais da maldita e amaldiçoada pneumónica. Mas, sendo tudo isto verdade, devo acrescentar que a vida pode mesmo ser, e é, de facto, uma alegria bem superior à alegria da cotovia, que em harmonia, sem gritaria, canta Avé Maria, dentro e fora da romaria… Isso mesmo. E é mesmo assim, com esta boa disposição que dou comigo a pensar e rezar a seguinte oração de Pablo Neruda:
«SENHOR, MEU DEUS, TIRAI-ME O PÃO, TIRAI-ME O AR, MAS NÃO ME TIREIS O SORRISO NEM A ALEGRIA».
Eu faço muitas vezes minha aquela oração de Neruda. É assim que vivo a tranquilidade da minha boa disposição e do meu sorriso nonagenário, concretizando aquele princípio escutista que tantas vezes ensinei aos lobitos de Areosa: «o escuta tem sempre boa disposição de espírito».
Reapareci. Vou ter o cuidado de sempre sorrir, nenhuma mentira urdir, dos arrenegados fugir e nada de bom omitir. E, hoje que reapareci, vou ter o cuidado de lhe não dizer porque razão, há uns tempos, desapareci. Fica para depois.