Capela da Senhora das Neves

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CASTELO DO NEIVA é terra de remotas tradições, banhada por um rio de remansosas águas, a beijar as salsas ondas do mar!… 

Singular é o seu Trajo, envergado por gente da riba marítima – como os “sargaceiros” de Apúlia – que fazem lembrar esculturas romanas… Lê-se, no Núcleo Museológico do Sargaço: «A tradição da apanha de sargaço (algas marinhas) para fertilizar o solo foi uma actividade tradicional fundamental para a agricultura das terras junto ao mar. Apesar de essa prática hoje ter caído em desuso, ficaram os saberes, os artefactos e os trajes (a branqueta) a lembrar esses tempos, e que são mostrados neste núcleo. Mas este espaço aborda também as enormes potencialidades das algas das nossas costas, com aplicações na medicina, na cosmética e também na gastronomia. O facto de grande parte destas algas ser comestível – e saborosas, além de muito saudáveis – faz com que integre já as ementas de vários restaurantes, dando um especial sabor aos mais requintados pratos.» 

Sem esquecermos as jangadas, as da Amorosa-Castelo do Neiva, que eram manobradas à vara, fundeando amarradas a poitas, e tripuladas indistintamente por uma ou duas pessoas, homens ou mulheres, não se afastando muito da praia para norte ou para sul…

O insigne médico e escritor José CRESPO escreveu, a pp. 60-61 do livro de sua autoria, Viana do Castelo (Edições Lusíada, Porto, 1960): «[…] Esta faina, meia agrícola, meia marítima, imprime à vida do litoral uma nota bastante curiosa. São as freguesias de Anha e do Castelo de Neiva as que mandam mais gente ao argaço, termo porque designam as variedades de algas que arrancam penosamente ao mar e depois estendem fora do alcance das marés. São empilhadas nos “palheiros”, onde secam para servirem de adubo.

Não andam só por cima dos penhascos. Investem com as ondas, até a água lhes dar pelo peito, envergando a pitoresca braqueta, espécie de sobrecasaca ou rendigote de lã grosseira, abotoada adiante até ao joelho e apertada na conta por meio dum cordão. Em vez da ganchorra apúlica, utilizam uma foicinha para apanhar as algas, isto as mulheres, pois os homens preferem navegar junto à costa, servindo-se de gadanhas grandes, com que as puxam para os barcos. São um misto de campónio e de pescador. Quando trazem barrete, lembram um varino; quando usam chapéu de oleado, lembram um marítimo. […]»

No Núcleo Museológico de Arqueologia de Castelo do Neiva, «os testemunhos provenientes da estação arqueológica do Castro do Monte da Guilheta, povoado fortificado da Idade do Ferro, localizado no Monte de Moldes, encontram-se expostos numa das salas do prédio da Junta de Freguesia de Castelo do Neiva. O espólio conhecido é rico e variado […]», castrejo, e também da romanização (entre séc. I a.C. e séc. I d.C.).

Com efeito, Castelo do Neiva tem origem pré-histórica. E no Caminho de Santiago – “Caminho Português da Costa” – a Matriz desta freguesia, Igreja de São Tiago, é considerado o templo com devoção mais antiga a Sul do Rio Minho, fora do território espanhol. Aquando da realização do Roteiro da Talha no Concelho de Viana do Castelo (editado em Janeiro 2019 pela Câmara Municipal), observei e registei, por detrás de um retábulo na nave do lado da Epístola, uma inscrição do século IX dedicada a São Tiago Maior pelo Bispo D. Nausti de Coimbra, “(…) ERA DCCCC”: Era de 900 (-38=862 anos), sabendo-se que a era hispânica (primeiro ano correspondente ao de 38 a.C.) vigorou em Portugal até à oficialização do calendário cristão, a partir de 1422, e apesar de se manter o hábito da contagem pela Era de César durante mais algumas décadas. 

     * * *

A Capela de Nossa Senhora das Neves tem missa quotidiana, atendendo à sua localização central, na confluência da Avenida da Praia com a Avenida de Moldes. No interior, contempla-se um retábulo de madeira em talha antiga, dourada e policromada, modelo do Maneirismo seiscentista, com pinturas devocionais. Em duas peanhas de pedra, as imagens da Senhora das Neves e de Nossa Senhora do Carmo. 

Perto deste templo, o Solar da “Quinta do Monteverde”: assim designado desde o século XIX. E, após obras importantes de reabilitação, incluindo o espaço envolvente, desde o ano 2000, Unidade de Hotelaria e Lazer, referenciada por “Quinta do Monteverde”. Na sua “página” de promoção, lê-se: «A pedra fundadora tem uma inscrição de 1491 e os registos da família remontam ao século XVI, quando D. Ana Lobo de Mesquita, da Casa do Alvito, desposa no Minho Manuel Domingos Barbosa. Em 1820, Luigi Vital Monteverde, bisneto do compositor Claudio Monteverdi, casa com D. Teresa de Jesus, a Morgada da Casa das Torres da Senhora das Neves, de Sendim, Castelo do Neiva.»

Com efeito, a Casa terá sido construída em meados do século XVI, sendo então designada Casa das Torres, do morgado da Senhora das Neves de Sendim, pertencente à família CUNHA LOBO BARBOSA SOTOMAIOR (que são os apelidos representados na pedra de armas do portal).

Na Avenida de Moldes, num espaço arborizado, a Capela de Nossa Senhora de Guadalupe. Tem Festas no Verão de Agosto em sua honra, assim como a Capela de Nossa Senhora dos Emigrantes no Monte do Castelo. No interior, retábulo de talha antiga (como a edificação da capela, atestada por lápide da família Cunha Lobo Barbosa Sotomaior, do lado do Evangelho), de que subsistem alguns elementos do Maneirismo do século XVII, envolvidos de talha mais recente, revivalista do século XIX.

Na lápide (tradução): Esta Capela é de Manoel Joaquim da Cunha Sotto Maior Senhor da Casa das Torres de Sendim desta Freguesia o qual a reedificou e acrescentou no ano de 1873. Tendo já sido de Diogo Burgueira e sua mulher Brízida de Mariz em 1617”. Assim se justifica a origem do retábulo da Senhora de Guadalupe, como também, por certo, do retábulo do século XVII, igualmente em estilo Maneirismo, que se admira na Capela da Senhora das Neves. (Vd. FERNANDES, Francisco José Carneiro: Talha – Roteiro no Concelho de Viana do Castelo, ed. Câmara Municipal de Viana do Castelo, 2019, a pp. 174-175).

N.R.  – O autor não segue o novo Acordo Ortográfico

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