De novo nas Azenhas do Prior

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Não temos cura. Raramente chegamos ao local combinado a tempo e horas. Joaquim Terroso já se ri quando nos vê ao longe, prontos para a apresentação das desculpas mal ensaiadas de sempre. – Meus amigos, importante é aparecer. Com atraso, ou sem ele, a presença tudo justifica. Apresento-vos aqui alguns amigos com quem fiz amizades recentemente. São vizinhos, mas como eles ainda trabalham, raramente nos encontrávamos. Bom, mas já nos conhecemos bem e não vale a pena contar histórias de miúdo interesse. Ah, e a minha Belmira, que está ansiosa de vos cumprimentar. Mas dela não precisais de apresentações, porque, como bem vos lembrais, esteve presente quando visitamos o Café Girassol.

– Meu Deus, sou um palavroso… É da velhice, sabem? – Não, não, tem uma memória de elefante. – Bem me tentais enganar, mas eu, agradecendo a simpatia, como sabeis, não tenho por hábito iludir a idade. Mas vamos lá ao que interessa. Estava a explicar aos meus amigos o que neste espaço existia. Sabem, enquanto vos esperávamos fizemos uma pequena visita aqui às azenhas de D. Prior, melhor dizendo a este Centro de Interpretação Ambiental, que teve projeto do jovem Arquiteto Jorge Cavaleiro, ao que me dizem, já de créditos firmados. Aqui adquirimos este fantástico álbum, de ilustração cuidada, edição da VianaPolis, com interessantes colaborações do João Alpuim e da Susana Ferreira. – Já conhecíamos amigo Terroso. – Sim, sim, vocês acompanham bem estas coisas. Bom, mas, em matéria de conhecimento da nossa linda cidade, eu também não deslustro os meus conhecimentos perante os demais. Apoiamos e, como já é usual, Joaquim Terroso ensaia o esmero no discurso. 

Já expliquei aos meus amigos como é que funcionava este moinho enquadrado neste espaço que denominaram como Azenhas de Dom Prior, que segundo Alpuim, se deve ao facto de ter sido António Pereira Pinto de Araújo, Abade de Lobrigos e Dom Prior da Colegiada de Barcelos, o primeiro a querer fazer aproveitamento agrícola deste espaço pantanoso, onde desagua o ribeiro de Fornelos e que se alagava com as subidas de marés. De boas intenções, este Prior, mas muito sonhador. Então ele não sabia que se tratava de um projeto irrealizável.  – Bom, mas depois veio o moinho, dissemos. Pois, e ele ainda aí está. Provavelmente, da sua responsabilidade, dado o seu entusiasmo pelo espaço inundado. Aí ele foi mais astuto, já que viu que o vai e vem das marés trazia e levava a água que faria mover o moinho. Apenas tinha que a apresar e, depois, na descida das marés encaminhá-la de forma a fazer rodar as mós que moíam os cereais. Tudo natural. Quase o “Ovo de Colombo”, pode dizer-se. No seu tempo deveria ter sido de grande importância, mas com o passar dos anos, lá ficou este bonito moinho a penar. Ainda bem que não urbanizaram todo este espaço, que tão abandonado esteve e tão bonito está presentemente, com pretensões a melhorar. Ah, já agora, este João Alpuim não é o Diretor do Museu Bordalo Pinheiro. Dissemos que sim, e que também era nosso amigo. – Muito interessante este moço. Já assisti a uma visita orientada por ele ao museu. Está a fazer um bom trabalho no Bordalo. Melhor o fizesse na sua terra… – Mas isso são contas de outro rosário, caro Joaquim. Vamos em frente, porque ainda vamos falar da construção de barcos neste espaço. – Muito bem, mas deixem que acrescente que, aqui nesta área onde está instalado o Hotel do parque, construído em 1972, devem lembrar-se porque não são muito mais novos do que eu… Um sorriso maroto estampou-se-lhe na cara. Também sorrimos e incentivámo-lo a continuar.  Pois, aqui esteve instalada a fábrica de serração de madeiras “Domenech”. Mas vamos em frente…

Sobre a construção de barcos, a palavra é vossa. Da minha parte, é assunto pouco estudado. – Vamos então ao assunto, excelentíssimo. Neste espaço tivemos dois pequenos estaleiros. O primeiro nos anos 20 do século passado, localizado muito próximo do espaço do Límia Parque, pertencentes à “Moderna Construtora Naval” e dirigidos por Bernardo Pinto Abrunhosa, um filho adotivo de Viana, ativo pugnador pelo progresso da nossa cidade, particularmente responsável por muitos melhoramentos no monte de Santa Luzia. Em 16 de Abril de 1920, o nosso Aurora faz uma abordagem circunstanciada sobre navios em construção na cidade e também este pequeno estaleiro é referido. Dizia então o autor do texto que se tratava de uma unidade ainda em fase de edificação, dada a falta de algumas oficinas estruturantes, mas com boas condições para a produção de barcos, onde já se construíam na altura duas chalupas, de nome Rachel e Dina, os nomes das filhas do diretor dos estaleiros. Com muitos trabalhadores aí empregados, a atividade era febril, acrescentava então o articulista, concluindo que se tratava de “uma boa escola contra a calaçaria”. Mas, pelo que se foi sabendo, o projeto não teve vida longa.

Mais tarde, já muito próximo da Praça de Touros, de que o amigo Joaquim tantas saudades tem, apareceriam os estaleiros de Manuel Gonçalves Pinto, “Manuel Calafate”, onde se produziram inúmeras embarcações para a pesca costeira, e que vieram a cessar atividade já nos anos 1970. – É verdade, desses pequenos estaleiros também eu me lembro. Em intensa laboração, tantas vezes os observei!!!

– Mas a verdade agora é outra caro Joaquim: a nossa visita e cavaqueira de hoje chegaram ao fim. – Tenho pena meus amigos. Estava mesmo a gostar. E para a semana, vamos até Santa Luzia, como tanto temos falado? – Se a isso estiver disposto, aceitamos o desafio. Mas o melhor é esperar até lá. E bom almoço para todos. – São nossos convidados. – Hoje até aceitamos – Bravo… 

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