O casal Antunes, açoreano de gema, emigrou para os Estados Unidos à procura de melhores dias. Por lá trabalhou, na Flórida, a fim de equilibrar a vida, no sentido de poderem construir uma casa na ilha de S. Miguel, de onde eram naturais. No começo a adaptação foi difícil, tanto devido aos costumes, como ao regime alimentar, complicando-se no aspecto linguístico.
A força de vontade moldou os hábitos. Ao fim de cinco anos regressaram à terra, na altura das festas do Senhor Santo Cristo dos Milagres. Vieram, como bons ilhéus, cumprir a promessa das graças obtidas. Na continuidade dos anos, passaram, depois, a estarem presentes neste encontro religioso e a acompanharem o Senhor pelas ruas engalanadas da cidade de Ponta Delgada. À custa dos dólares sentiram-se mais seguros e com outra filosofia de viver.
Tudo lhes correu bem, devido ao amparo do Senhor Santo Cristo, conforme diziam. Ao fim de anos de luta, de trabalho, de inúmeros sacrifícios e privações conseguiram alcançar uma posição estável. A moradia, na terra natal, bonita, airosa, com um grande logradouro repleto de árvores de fruto e flores, a destacarem-se as hortências, já se encontrava edificada. Não tinham filhos. A medicina confirmava essa impossibilidade. Coincidências do destino.
Um dia, naquelas paragens americanas, ao assistirem a um sarau na Casa do Minho tiveram oportunidade de anotar o programa das Festas da Senhora da Agonia. Em paralelo, foi distribuído um roteiro ilustrado com fotografias a publicitar o Monte de Santa Luzia, que registaram, despertando-lhes curiosidade e interesse em visitar. No desdobrável turístico podia ler-se que esse monte sobranceiro à cidade é um belo miradouro natural do Alto-Minho, considerando-se um dos recantos mais aprazíveis do país. Sublinhava-se que do alto da montanha desfruta-se uma diversidade de aspectos paisagísticos sobre povoados, vales, serranias, rios e o oceano. Era dado destaque, ainda, ao seu interesse arqueológico, sanitário, literário e religioso, que advém das ruínas da velha citânea, que remontam da época luso-romana, aliado à amenidade do seu clima repousante e do Templo Monumento, motivo de peregrinações e de devoção popular.
O acesso podia fazer-se a pé, pelo escadório, por elevador e através dos transportes rodoviários, seguindo a estrada que vem abraçar, graciosamente, a elevação, apreciando magníficos recantos e mirantes de abundante sombra. A paisagem acolhedora, graciosa e fascinante descortina-se na subida e descida, aqui e acolá, por entre clareiras de exuberante vegetação.
O casal Antunes, que da sua Pátria só conhecia os Açores, ficou a pensar em fazer umas férias repartidas, entre aquele arquipélago e o continente. Deslocaram-se ao Minho. Instalaram-se num dos hotéis da cidade de Viana do Castelo. Assistiram à Romaria da Senhora d’Agonia, em pleno mês de Agosto, festa litúrgica e pagã, fidalga e popular, repleta de alegria, de animação e de cor. A princesa do Lima, nesta altura, veste-se de galas e adornos, ao som das músicas dos altifalantes, das bandas nos coretos e dos cantares ao desafio, numa polcromia de vibrações sonoras, de luz e de calor humano.
Apreciaram a gastronomia local. Beberam o saboroso vinho verde deliciaram-se com a gostosa comida dos restaurantes típicos da região. Assistiram à Festa do Traje, às procissões e cortejos, culminando com os fogos de artifício produzidos por afamados pirotécnicos. Na memória deles ficou gravado, para sempre, a Serenata no rio Lima, demonstração graciosa e feérica de fogo aquático e aéreo.
Antes de se despedirem dos vianenses, que os souberam receber, foram visitar a igreja de Nossa Senhora d’ Agonia. Trata-se de uma construção de porte elegante e altivo com paredes caiadas de branco e uma torre esguia, em contacto com o céu, sempre pronta a proteger os pescadores, em conjunto com o farol, quando na faina da pesca vão para o alto mar. A imagem imaculada ainda se encontrava no andor que nos séquitos religiosos percorrera as principais ruas da cidade e de barco navegara pelo mar Atlântico.
Deixaram à Santa as suas preces e a esperança de voltarem. Regressaram, realmente, no ano seguinte, a fim de cumprirem a parte restante da promessa. Além de serem pessoas que já tinham mais de quarenta anos e o estigma de não poderem procriar, traziam com eles, ao colo, o filho desejado, de aspecto robusto, que lhe foram mostrar e pedir a sua bênção.