Os fundadores da ciência económica consideravam a propriedade privada como o fundamento da liberdade, sem a qual não haveria desenvolvimento económico e social nem democracia. Para eles, a saúde da economia das nações dependia da fluidez do mercado, isto é, do livre jogo da oferta e da procura, como a saúde humana depende da fluidez do sangue no sistema circulatório. E, segundo os mesmos, o Estado existiria para defender a propriedade e a ele era confiado o encargo de pôr de pé e manter as infraestruturas e superestruturas indispensáveis ao bom funcionamento da economia moderna.
Mais de dois séculos depois, após tantas revoluções e duas guerras mundiais, este “quadro económico” ainda continua a ser referência para defensores e opositores do mesmo, politicamente considerados à “direita”, os primeiros, e à “esquerda”, os segundos.
Nas últimas décadas, em Portugal, as conceções políticas sustentadas pelos opositores do referido “quadro”, alegando preocupações de desenvolvimento com acento marcadamente social, resultaram no engordamento e insuficiente transparência do Estado.
Entre as nefastas consequências da obesidade e da opacidade do Estado contam-se: o crescimento da despesa pública e da carga fiscal, a que as empresas e famílias estão sujeitas; a contenção do investimento público e privado; a degradação da qualidade dos serviços públicos, particularmente os da saúde e da educação; a burocracia que asfixia a vida económica e social e contribui para a persistência da economia paralela; e, por fim, a última mas não a menos importante, a corrupção, a prevaricação e o tráfico de influência, na administração pública e nas autarquias.
A situação a que chegamos tornou-se explosiva. Bastou que, após algumas detenções, um comunicado da Procuradoria-Geral da República servisse de detonador de uma grande explosão política: o Primeiro-Ministro apresentou o pedido de demissão e o Presidente da República, aceitando-a, anunciou a dissolução do Parlamento e a marcação de novas eleições.
E agora?
Agora, não percamos a memória para que sejamos dignos e capazes de construir o nosso futuro, em democracia… saudável!
Carlos Branco Morais