Santa Luzia dos meus olhares; Santa Luzia bonita és; Santa Luzia dos meus amores; Viana acordada está a teus pés.
Viana acordada. Basta de Viana dorme. A cananeia (Mateus 15,21) vai-me ajudar a falar de Santa Luzia. E, como dizia o Tio Zé Quintas de Lanheses, vamos lá com a graça de Deus. Uma rapariga possessa. Uma mulher confiante. Uma mãe orante. Uma filha necessitada. Uma beleza de moça com um satanás assanhado. Uma mulher que precisa de Jesus e um Jesus que precisa daquela mulher para ensinar os discípulos a viver na fé os engenhos que a vida prepara. Um Taumaturgo que vai atender uma forasteira e um grupo de machos que vão aprender a lição. O local até é bem fraco porque é um caminho usado e com bosta de gado: tudo desapropriado. Mas a hora é aquela. Jesus vai a caminho da cidade de Tiro e quem caminha não quer estorvos. Mas uma treteira estrangeira interceta-O e ELE, por delicadeza, obriga-se a parar. Ela intrometeu-se não por ser treteira, mas porque sofria, porque precisa e porque tinha certezas. CERTEZAS. As certezas da fé… Quem precisa mete-se, intromete-se, submete-se, derrete-se, compromete-se e até faz má figura. Mas vai conseguir. Uma filha é um pedaço de qualquer mamã. O que tem que ser tem muita força e até tem a força toda, apesar do estorvo ou empecilho: é que mãe e filha são estrangeiras e, ainda por cima, cananeias e, se calhar, até feias; são mulheres sem valor e até comparadas com as arranjistas da valeta. Mas a fé ultrapassa montanhas. A decisão está tomada e aquela mãe vai usar a voz como arma; e então fala, pede, insta, insiste, chora e grita. E grita e torna a gritar. Ela até sabe que gritar não é das normas da convivência; mas não era ela a gritar; quem gritava era a sua dor. A filha estava doente, muito padecente, desgastada, cansada, saturada, estragada, inutilizada… chega!…. Aquela hora é a hora do tudo e só do tudo. É por isso que usando a voz como arma e ultrapassando as normas urbanas da praxe, entra em cena. A cura está ali e só pode vir dali. Gritos estridentes, insistentes, persistentes, renitentes mas sobretudo crentes. Ela sabe que é feio gritar e fazer cenas. A urbanidade fica bem a todos. Mas!…E o griteiro incomodou os machos acompanhantes de Jesus:
“Despacha-a, Senhor, porque ela incomoda-nos com os seus gritos”.
Despacha-a? HOMENS E BASTA. Mas o facto é que de intervenção nada elegante, veio uma resposta desarmante: <Não fui enviado senão às ovelhas perdidas da casa de Israel>.
Eles perceberam e calaram-se; ela percebeu, mas não se calou. (Eu também não me vou calar)… Ultrapassando limites, ajoelhou-se no chão e deu mais um berro: <Socorre-me Senhor>. E fez-se silêncio. Silêncio gritante com resposta arrepiante: <Não é lícito tirar o pão dos filhos para o dar aos cães>.
Pior do que isto nada e nada mesmo; mas a desgraça necessitante e a fé orante ultrapassaram a resposta desarmante: <Pois é, Senhor, mas olha que até os cachorrinhos comem as migalhas que caem da mesa dos seus donos>. Fé e humildade a toda a prova. E a graça veio: «É grande a tua fé. Faça-se como desejas>.
E aconteceu a cura. Fé provada. Graça dada… Os discípulos aprenderam com a mulher humilde e confiante, a mulher orante e aceitante, a mulher caminhante com toda a capacidade de ENCAIXE.
Não quero morrer sem ver a imagem do Coração de Jesus no lugar que LHE pertence no Monte de Santa Luzia. Vou fazer como a mulher cananeia. Ter CERTEZAS e ENCAIXAR até ALCANÇAR.