Estranha democracia

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A. Lobo de Carvalho

Causou-me profunda repulsa a campanha que o Bloco de Esquerda (BE) levou a efeito para que a líder da extrema-direita francesa fosse impedida de intervir na Web Summit a realizar no nosso país, como se esta líder política gaulesa pudesse comer tblg’s ao pequeno almoço! Pergunto por que razão temos de aturar a extrema- esquerda portuguesa a toda hora, e não se pode ouvir a líder francesa da extrema-direita! Mas que democracia é esta que o BE defende? Uns podem dizer tudo e outros não podem abrir a boca? Manifestamente, devo dizer que não reconheço a este extremismo de esquerda qualquer ascendente sobre quem quer que seja e muito menos dar lições de patriotismo.
Numa democracia está implícita a liberdade de expressão do pensamento e, que se saiba, Portugal, para desgosto de alguns, ainda é uma democracia onde as pessoas são livres de dizerem o que pensam. E tal como BE usa o seu direito de verbalizar aquilo que entende, mesmo as maiores atoardas que ferem leis da natureza, também qualquer outro agente político, individualmente, ou em nome do agrupamento a que pertence, pode expor as suas ideias, agradem ou não àqueles ou àquelas que se julgam ou pretendem assumir-se como polícia dos costumes.
Sabemos que a ideologia política da extrema-direita contém aspectos anatemizantes, mas também defende alguns valores civilizacionais relevantes. E cada um que lê, escuta ou assiste às intervenções públicas, absorve e interpreta a informação, mas só aceita aquilo que lhe interessa porque não é obrigado a concordar com nada. Tal como acontece com o BE, que não se cansa de desvalorizar princípios e valores que, no meu ponto de vista, enformam a sociedade, mas só o segue quem quer. Por exemplo, eu jamais apoiarei as políticas fracturantes do BE, mas não é por isso que deixo de ouvir alguns dos seus membros nem que, por vezes, seja apenas para me rir. Isto para dizer que o BE defende um extremismo de esquerda que não agrada a milhões de eleitores, mas não é por isso que o impedem de falar e agir. Então, porquê o medo de ouvir a líder francesa? Qual a razão de não poder expressar-se num país livre e democrático? Será algum temor em perder eleitorado?
Fique bem claro que não sou simpatizante da extrema-direita nem da extrema-esquerda, esta nascida de uma miscelânea de teorias trotskistas e estalinistas. Defendo, sim, o direito de todo o cidadão se poder pronunciar sobre qualquer temática, sem medos e respeitando a liberdade dos outros, na certeza de que são esses mesmos cidadãos que fazem as suas escolhas e, por isso, assiste-lhes também o direito de poderem ouvir os líderes das várias correntes políticas para recolherem informação e fazerem opções conscientes.
O Bloco de Esquerda, desde que se assumiu como fiel da balança do poder político em Portugal, passou a agir de forma arrogante como que seja o dono da quinta, secundarizando o partido maioritário que o promoveu. A sua influência na acção governativa é um facto e a tudo se presta para se manter nesse patamar. E este concreto caso de tudo ter feito, visando impedir Marine Le Pen de discursar na Web Summit, no nosso país, evidencia uma manifestação aberrante de extremismo xenófobo, que não dignifica o país, mas o prejudica em termos de vivência democrática.
Sinto pena desta nação por ter uma maioria de políticos coniventes com a destruição dos valores da civilização, da sociedade, da família, da moral, da ética!… O materialismo passou a imperar, sendo notória a degradação dos bons hábitos e costumes, como se a sociedade em que vivemos seja um bando de irracionais. Não! Não somos irracionais e temos um espírito, uma alma, que nos distingue da zoologia e, quando menos esperarmos, surgirá o momento em que seremos confrontados com essa realidade. A vida não pode ser só o gozo do momento; é muito mais para além disso!
Para finalizar, e considerando a intervenção política da líder do BE em Marselha, França, muito recentemente, onde pôde expor as suas ideias sem que a extrema-direita gaulesa clamasse pela sua proibição, diria que levou uma estalada de luva branca para a fazer pensar o que é a tolerância num país onde os partidos são civilizados e respeitam a liberdade de expressão. Que tenha aprendido a lição e o que verdadeiramente é a liberdade de expressão. Mas, sinceramente, duvido que isso aconteça porque a cegueira política, ao ponto que atingiu, já não tem remédio.

(Imagem: “memórias do cotidiano”)

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