O mundo está revolto! Está agitado, desafiante como nunca o vimos (ou não lembrávamos…)!
Estamos a ser postos à prova, a tentar sobreviver às vagas ainda que não haja tempo de vir à tona entre elas; somos ciclicamente puxados para baixo, onde só há tumulto e escuridão. Na maioria dos dias lutamos para voltar acima uma vez mais mas, ainda assim, acho que todos temos alturas em que nos deixamos ir… Não sei se o fazemos por descrença, se por exaustão de tanto contrariar, se pelo medo.
Sempre me inquietou esta dualidade do medo, que ora fragiliza e impede de agir, ora nos impele para lutar. E frequentemente me lembro d’ O Mostrengo na “Mensagem” de Fernando Pessoa. O poema personifica as dificuldades de navegação dos portugueses na imagem de um monstro vindo do fundo do mar, de voz grossa e aterradora. É nesse monstro e é nesse navegador que o enfrentou que penso sempre que sinto ou falo sobre o medo. Porque esta é também uma história de superação e garra perante o desconhecido.
Diariamente todos nós somos confrontados com os nossos mostrengos a surgir do breu, diariamente todos nós somos homens neste mar agitado. Todos trememos de medo perante a perda, a doença, a solidão, o desafio, o inesgotável, a ansiedade que sufoca ou o mal que toma conta. Mas também em todos nós há o homem do leme que grita “Aqui ao leme sou mais do que eu:/ Sou um Povo que quer o mar que é teu;/ E mais que o mostrengo, que me a alma teme/E roda nas trevas do fim do mundo;/ Manda a vontade, que me ata ao leme,/ De El-Rei D. João Segundo!”.
Não há quem não trema perante o grotesco e a escuridão mas acredito, também, que todos somos capazes, em algum momento, agora ou mais tarde, de reprender as mãos ao nosso leme, gritar bem alto e conquistar o mar que queremos. Todos somos voz e vontade de um povo que renomeou o Cabo das Tormentas! Precisamos apenas de, a cada dia, saber o que ganha em nós: o medo do Mostrengo ou a coragem do homem do leme.
Hoje, o que ganha em si?
Inês Grenha
Interna de Psiquiatria na Unidade Local de Saúde do Alto Minho