O livro de Fra Diávolo

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Alfredo Reguengo (1909/1980), para além de ter escrito para diversas publicações, foi colunista do “A Aurora do Lima” (AAL) até à sua morte. Aqui escreveu intensamente sobre muitos e variados temas, mas particularmente poesia. Também aqui dirigiu uma página literária com o título “Lume Novo”. Era um antifascista determinado, apesar das perseguições que o regime lhe moveu e de ser um homem de estatura frágil. 

Depois de concluir o Curso Geral dos Liceus em Viana, tornou-se empregado bancário no Porto e, mais tarde, funcionário administrativo da Direção Escolar nesta cidade onde estudou. Mas o Estado Novo não permitia desvios à sua doutrina e tratou de o expulsar. Prendeu-o várias vezes, mas ele não vergou, apesar de ter que recorrer a empregos precários. 

Felizmente, em Portugal fez-se dia em 25 de Abril de 1974 e aí funcionou a justiça com a sua reintegração na Função Pública. Depois, foram seis anos a trabalhar abertamente nas causas porque sempre se bateu. Legou-nos uma vasta obra, particularmente poética, tendo sido selecionada e publicada em edição póstuma, em 1987, “Obras Completas de Alfredo Reguengo”, integrando uma coletânea de poesia inédita denominada “Um Fio de Música”. 

Adiantando, em 1938, na tipografia desta casa foi-lhe publicado “Fra Diávolo”, heterónimo que subscreveu boa parte dos seus escritos. Um livrinho de cem páginas, onde, em poesia, explora intensamente o amor. Foi parar às mãos de Jaime dos Anjos – outro resistente que não pactuava com o regime salazarento –, que trabalhava no Eugénio Pinheiro, uma casa que chegou a empregar cerca de 500 trabalhadores, de que hoje não se fala, mas que foi marcante no contexto do comércio de Viana. Reguengo, nesta edição onde o amor se exalta excelsamente, plasmou a dedicatória “Ao camarada Jaime dos Anjos, com um abraço do Alfredo Reguengo”. Felizmente, a Pide não lhe deitou a mão, mesmo em Lisboa, para onde o Jaime se mudou com a família nesse tempo tenebroso. 

E este primor de obra chega-nos agora pela mão da filha do Jaime, a Graça Anjos. Herdou a assinatura do AAL do pai (provavelmente já tem ou está próxima de um século), pela qual se informa sobre a cidade onde nasceu e que visita em cada ano. Foi pena não a fotografarmos quando deixou o livrinho na nossa receção. Mas conversamos longamente pelo telefone e ficou combinado um encontro formal e amigo quando voltar de novo. Cá estamos à espera. Já agora, no poema “Ceguinho da Romaria”, escreveu   Alfredo Reguengo: “Não peço esmola a quem passa; quem passa, ri-se da gente… – o pior… é que a desgraça passa ali continuamente…”

GFM

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