O rescaldo eleitoral

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Independentemente das razões que se possam apontar, qualquer análise das eleições legislativas deve assentar numa verdade de “la palisse”: os eleitores concederam ao PS uma esmagadora votação, que redundou numa inequívoca vitória. E isso não é coisa pouca quando falamos de democracia.

De um modo geral resolveram uma questão muitas vezes colocada: a governação dos últimos seis anos foi, para a esmagadora maioria dos portugueses, globalmente positiva.

Claro que os incidentes relacionados com o orçamento de estado não aprovado estão diretamente relacionados com a perda acentuada da esquerda à esquerda do PS, mas não só. A previsão de subida do Chega, e um eventual entendimento com o PSD, ainda que tático e nunca cabalmente esclarecido, levou a uma tomada de consciência acerca dos perigos de envolver na governação, mesmo que indiretamente, um partido irresponsável, xenófobo e racista, condicionando assim o comportamento de muitos eleitores de esquerda, que concentraram as suas opções de voto no Partido Socialista.

O PSD, por seu lado, tinha uma grande desvantagem. Enquanto o PS tinha à sua esquerda dois partidos já bem conhecidos da sociedade portuguesa, PCP e BE, com o ónus do chumbo do orçamento, o PSD lutou contra a presença de duas forças partidárias novas, com discursos diferentes dos habituais, condição que se afigurou mais apelativa para muitos eleitores de direita cansados dos projetos estagnados dos partidos tradicionais. O PS livrou-se, por agora, da pressão parlamentar da esquerda, sendo certo que, o acréscimo da votação que teve, se deveu, exclusivamente, aos votos de eleitores de esquerda. Isso traz responsabilidades acrescidas no desenho das políticas futuras, pois a mensagem do eleitorado foi bastante clara. O PSD pode vir a ser ainda mais canibalizado pela nova direita, especialmente pela Iniciativa Liberal, que, com uma mensagem do sucesso ao virar da esquina, se torna apelativa para algum eleitorado jovem.

Interessante será perceber até onde pode ir o crescimento do Chega. Um partido vazio de ideias, agressivo, desrespeitador da Constituição da República, defensor de muitos dos princípios que os portugueses rejeitaram em abril de 1974, não deveria, aparentemente, ter crescido desta forma.

Não obstante, se olharmos para os países da Europa, verificamos que os partidos xenófobos da extrema-direita, apresentam em inúmeros casos, enormes crescimentos pouco explicáveis, atingindo metas antes inimagináveis. Neste novo quadro parlamentar, teremos certamente um extrema direita muito agressiva e provocadora conforme inscrito no seu ADN.

O combate a esta organização terá de ser feito, em meu entender, mais através de políticas concretas e de posturas serenas por parte dos partidos democráticos, e muito menos pela via da confrontação, que é o campo onde eles se sentem confortáveis e para o qual vão tentar arrastar todos os outros: o campo enlameado da violência verbal e da discussão estéril.

Espera-nos assim uma legislatura diferente, em que a responsabilidade do partido maioritário assume nova importância, esperando eu que os próximos quatro anos possam ser determinantes para o desenvolvimento do país, caminhando decididamente rumo à convergência com os países da UE, reforçando o estado social, combatendo a pobreza com políticas determinadas, que transmitam segurança e estabilidade aos portugueses. 

Cada um fará agora o seu caminho, preparando as propostas que serão votadas em 2026.

José Barbosa

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