Joaquim Terroso bem se esforça por não dar parte de fraco, mas agora somos nós a reconhecer que a idade não perdoa. São 86 anos, meus amigos, costuma dizer-nos amiúde. As visitas que nos fazia com regularidade vão escasseando e, por vezes, a denotar cansaço. Há dias, sem avisar apareceu, fez a saudação costumeira e sentou-se de imediato. – Peço perdão, mas vivo um tempo em que só me sinto bem sentado. Se me quisessem aturar por algum tempo, poderíamos falar um pouco desta linda Rua onde a nossa Aurora se situa, particularmente sobre um excelente fotógrafo que, a poucos passos daqui, paredes meias com o Arquivo Distrital, teve instalado o seu estúdio, um tal Manuel Filgueira. – Sim, já ouvimos falar, amigo Joaquim. Olhe, o filho dele, de boa saúde, ainda há pouco tempo nos fez uma visita. – Pois, eu vi a notícia em que deram conhecimento do facto. – Se estiverem de acordo, então, fazemos um curto passeio aqui por esta Rua de São Sebastião, sim porque assim se denominou até 1922, quando lhe atribuíram o nome do Bacharel em Matemática, Manuel Afonso Espregueira, nascido em Viana do Castelo, em 1855, e falecido em Vila Franca, em 1917. Já agora, permitam-me que vos adiante que o nome de São Sebastião foi atribuído a esta rua que calcorreamos, porque a mesma desembocava no Largo de São Domingos, onde se localizava a capela de São Sebastião, na retaguarda da Convento de São Domingos.
Mas deixemos essas considerações e, se me permitem, convido-vos mesmo a deslocarmo-nos até ao nosso Arquivo, que em tempos foi Casa da Vedoria. – Claro que aceitamos amigo Terroso. – Então vamos, mas devagar. Compreendemos e acedemos. Aí chegados, Joaquim Terroso olha curioso para os números de polícia dos prédios. – Muito bem, cá está, número 154, foi aqui que meu falecido pai me trouxe para fazer as primeiras fotografias. O estúdio, bem apetrechado e concebido pelo Senhor Filgueira, situava-se ao fundo do quintal, que ia da Rua Manuel Espregueira à Rua General Luís do Rego, no sentido de fazer o máximo de aproveitamento da luz natural, até porque a eletricidade, naquela época, estava ainda numa fase embrionária.
Nas amplas e envidraçadas janelas havia pesados cortinados, que movimentava de acordo com a luz pretendida para as diversas formas de fotografar. Tudo naquele estúdio tinha o seu cunho muito pessoal, até as cadeiras onde se sentavam os fotografados. Profissional exigente, sem dúvida.
– Então caro Joaquim, que mais nos pode dizer sobre este afamado mestre da fotografia. – Ora, tivesse eu saúde e ficaria aqui a falar convosco durante longas horas. Mas não. Vou-vos deixar. Termino dizendo-vos que Manuel Filgueira não era natural de Viana do Castelo, mas, pela sua participação na vida social desta cidade e pelo espólio fotográfico que nos legou, onde nada escapou à sua objetiva, deixou claro que vivia a nossa sociedade com tanta ou mais intensidade que muitos daqueles que aqui nasceram.
– Olhem, mas por hoje é tudo. Se quiserem, brevemente vos faço nova visita, para vos falar deste homem curioso e multifacetado. – De acordo, Caro Joaquim. Apareça-nos que teremos muito prazer. Já agora, faça-nos companhia até à redação. – Sim, sim, hoje nem sequer faço o meu pequeno giro pela nossa Praça da República. Só nos restava a despedida. Mas a melhor informação já morava do nosso lado, que tão amigavelmente Trancoso nos tinha cedido.