A vida normal do Homem sobre a terra compreende três fases marcantes: começo, desenvolvimento, finitude. A princípio, ele gatinha, depois, marcha e corre; finalmente, surge a meta derradeira… Quando criança, observa e aprende quando adulto, voa no alto, na idade madura, cisma, deplora, despede-se…
São fases vitais do Homem, o qual, sendo o mesmo Eu, parece diferente: no aspecto, no saber, no sentir, no desejar, no ganhar e perder… Qual destes patamares o mais importante e sadio confesso não saber e duvidar se alguém o saberá…
Se tentarmos comprimir essas três fases em duas apenas, eu diria assim: na vida normal de um Homem eu vejo somente duas fases: a do “Quero, quero” e a do “Deixo, deixo”…
Procurando agora caracterizar e distinguir essas duas fases, eu penso deste modo: há uma fase na vida em que o Homem sente avidez: no saber, no imaginar, no sonhar, no voar, no adquirir, no conquistar, no suplantar, no ser o Maior…!
Impulsionado por essa avidez natural, o Homem conjuga com sofreguidão o presente-indicativo do verbo Querer: novos horizontes, novas vitórias, novos pedestais de fama e glória, novos mundos sem fronteiras… Eu chamo a isto a fase do “Quero, quero”… Alavanca potentíssima que faz o mundo progredir! Arco íris encantador que embeleza e dá cor à Vida…! Anelos de grandeza insaciável…!Ânsia sequiosa de Eternidade e Infinito…! O Homem derruba muros e não aceita constrangimentos…! “Pelo sonho é que vamos!” – cantou o nosso Sebastião da Gama! “O sonho comanda a vida!” – cantou o saudoso António Gedeão.
A idade, entretanto, vai aumentando, vai subindo, vai deixando marcas, vai ensinando verdades, vai surpreendendo negativamente, vai subtraindo forças, vai desmaiando cores, vai avariando a máquina, vai substituindo peças, vai semeando desilusões, vai recorrendo a próteses, vai verificando com mágoa que a sua linda “torre de Pisa” já começa a oscilar e a tremer…!
Chegado a este pôr de sol, o Homem (crente ou incrédulo) começa a duvidar do azul do céu, da luz radiante do meio-dia, da poesia da vida…!
Chegou a fase do “Deixo, deixo”…! As amarras partiram-se… Os remos emperram… O verão emigrou dizendo adeus… O inverno foi entrando sem bater à porta… A Noite já entoa, triunfante, o hino glorioso da vitória sobre a Luz…
É então que o “Hércules” feito anão começa a duvidar do sentido da vida, que já mais lhe parece uma bola-de-sabão prestes a rebentar, por entre risos da ventania… Adormeceram profundamente o Sonho, a Utopia, a sedução dum “Amanhã” cor-de-rosa…!
Neste beco-se-saída, nesta encruzilhada sem perspectivas, neste nevoeiro denso de dúvidas angustiantes, surge então, para os não desesperados, a bendita Luz da Fé, iluminando as Trevas com uma seta-dourada de sentido único apontando o além, Reino inefável de Ventura perene…!