Segundo o ICNF (Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas), os Estuários dos Rios Minho e Coura integram uma lista de 39 locais classificados em Portugal Continental como Zonas de Proteção Especial (ZPE) – Diretiva Aves, uma Diretiva Comunitária que pretende que cada um dos Estados Membros tome as medidas necessárias para garantir a proteção das populações selvagens das várias espécies de aves no seu território da União Europeia. Esta Diretiva impõe a necessidade de proteger áreas suficientemente vastas de cada um dos diferentes habitats utilizados pelas diversas espécies; restringe e regulamenta o comércio de aves selvagens; limita a atividade da caça a um conjunto de espécies; e proíbe certos métodos de captura e abate, incluindo uma lista com espécies de aves que requerem medidas rigorosas de conservação do seu habitat. As ZPE declaradas por cada Estado Membro integram diretamente a Rede Natura 2000.
Até à data, dos 253 registos de espécies no distrito de Viana no portal eBird (um banco de dados on-line de observações de aves utilizado por cientistas, pesquisadores e naturalistas amadores em tempo real sobre a distribuição e a abundância de aves de todo o mundo) 208 concernem ao concelho de Caminha, sendo que 146 foram feitos no Sapal do Rio Coura que é parcialmente atravessado pelas pontes ferroviária da Linha do Minho e pela rodoviária que liga a N13 de Caminha a Seixas. Estes registos correspondem a espécies residentes todo o ano, às nidificantes estivais (migradoras na época primavera/verão oriundas de África), às invernantes (outono/inverno vindas das latitudes a norte) e às migradoras de passagem que fazem escala no Sapal temporariamente para repouso e alimentação no decurso das suas viagens mais longas.
Esta alusão surge no decurso do EUROBIRDWATCH 2022 – Fim de semana Europeu de Observação de Aves –, organizado anualmente pela BirdLife Internacional em todos os países da Europa, coordenado em Portugal pela SPEA (Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves) e que decorreu no fim de semana de 1 e 2 de outubro, a que a COREMA (Associação de Defesa do Património) aderiu como já o vem fazendo há alguns anos, a exemplo de outras associações e instituições ambientalistas do distrito.
A ação decorreu este ano precisamente no Sapal do Coura envolvendo vários observadores que anuíram ao anúncio da iniciativa. Porém, os pontos de observação foram os perigosos passeios da velha ponte rodoviária à falta de um observatório inversamente ao que sucede por exemplo em outras áreas classificadas como o Estuário do Cávado ou as Lagoas de Bertiandos, possuindo esta última inclusive um centro interpretativo.
A reforçar a necessidade de um observatório ligado por passadiço a partir da N13 em Seixas logo após a ponte para jusante) é que este «hotspot» atrai, pela sua biodiversidade, observadores portugueses e espanhóis durante todo o ano, mas principalmente no período outono/inverno quando se concentram no local vários bandos de limícolas nas fases entremarés. E todos utilizam a ponte já que o Sapal é bastante largo na desembocadura no leito do rio Minho e o cais da margem esquerda não permite uma observação conspícua, porque as aves estão normalmente ocultas entre as lamas das restingas com erva. Além disso, cada ação de observação implica tempo e uso de equipamento caro que necessita da proteção de um abrigo.
Sabe-se que já existe um financiamento por parte da Câmara de Caminha de 1,5 milhões de euros para a requalificação da margem esquerda do Coura por uma área de 124 hectares desde Vilar de Mouros até Caminha com recurso a técnicas de engenharia natural, a recuperação de zonas da galeria ripícola, plantação de árvores e arbustos, a eliminação de manchas de espécies exóticas invasoras e a plantação de caniçais, a criação de percursos pedonais e cicláveis ao longo de toda a extensão da intervenção.
Mas esta operação consiste na execução de um conjunto de trabalhos, desenvolvidos no âmbito do “Estudo Hidrológico e Fluvial dos rios Âncora, Coura e Neiva” elaborado pela Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto para a Polis Litoral Norte e nada tem a ver com a valorização do Sapal. É só preciso um observatório, mas sem mexer no que a Natureza foi construindo ao longo de décadas sem ação humana. O contrário seria um erro grosseiro irreversível como sucedeu depois da construção da ecovia marginal Valença Gondarém que afastou inelutavelmente as aves para as ilhotas da margem espanhola.
Jorge Leitão