Também acredito que somos um povo de bem e que nos pautamos por elevados índices de urbanidade. Não há sociedades perfeitas e estas devem ser medidas pelos padrões mais gerais das suas virtudes e defeitos, caso contrário, como é comum dizer-se, estamos a “ver a floresta pela árvore”. E as nossas práticas comportamentais definem-nos como um povo ordeiro, educado, e solidário.
Mas também não podemos aderir a esta abordagem bondosa e simpática omitindo comportamentos que, mesmo isolados e pontuais, são merecedores de repulsa. Silenciar ou justificar o crime é ser conivente com ele. Não há meios-termos: um delito é um ato condenável e tudo deve ser feito para que ele não se pratique. Há crimes e crimes, costuma dizer-se. É verdade que há graus diferentes de apreciação nas condutas reprováveis. Não podemos comparar uma briga de amigos, por exemplo, com uma emboscada com o intuito de agredir cidadãos, tantas vezes até à morte.
O cometimento grave, para além de revelar a natureza e formação dos indivíduos que o praticam, infelizmente, cada vez mais acontecem por fanatismo ideológico, desportivo ou outro. E isso é preocupante. Manifesta intolerância em relação a terceiros e, fundamentalmente, falta de controlo emocional. Um cidadão manietado por um qualquer credo deixa de ser livre, dai perigoso para a sociedade. Será, acima de tudo, um personagem dependente de alguém e que alguém facilmente o subjuga.
Entre nós o fanatismo mais exacerbado acontece no mundo do futebol. A equipa do coração não ganha, logo as culpas recaem sobre a arbitragem, a falta de empenho dos jogadores, as manobras de secretaria ou tantas outras desculpas anedóticas. A cegueira do adepto clubístico nunca o deixa raciocinar de forma pragmática, compreendendo que a sua equipa, por qualquer motivo, jogou mal, que o adversário foi melhor ou se houve outros azares que não se esperavam.
O que temos visto recentemente é este espetáculo triste de insulto e agressão a jogadores que ontem se idolatravam e se beijavam como santos. Quem assim se comporta acaba abertamente a fazer um outro jogo, que é o de apoio a dirigentes que apostam em governar clubes de acordo com agendas próprias.
Nos tempos presentes, tenho para mim que o futebol, concretamente, em termos de manipulação de mentes, tem caminho aberto para retratar mal a comunidade que somos. É pena, porque um desporto tão bonito e agradável de se ver, que também nos representa briosamente extrafronteiras, não merecia esta imagem pobre que dele estão a dar.
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