Tempestade política

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A. Lobo de Carvalho

Como se não bastassem já as chuvas torrenciais que tantos prejuízos têm causado por tudo quanto é sítio, o país tem vindo a ser assolado, também, por uma tempestade política como não há memória, enfraquecendo a coesão social e colocando instituições sob suspeita, na sequência da detecção e conhecimento público de titulares de altos cargos da administração do Estado que se faziam passar por impolutos.  A isto soma-se o elevado preço dos bens de consumo, a subida da inflacção e as greves em sectores fundamentais, como sejam os transportes públicos e o ensino, o que transforma este país num lamaçal onde se torna difícil viver e sonhar.

No artigo publicado na edição de 05 do corrente mês de Janeiro, neste jornal, subordinado ao título “Águas turvas da corrupção”, sugeri, para acabar com os vexames a que temos vindo a assistir, submeter a rigorosos testes psicológicos qualquer candidato que fosse nomeado para altos cargos da política e da administração do Estado, visando, concretamente, aferir da sua idoneidade para o desempenho de funções públicas. Perante os últimos casos em que telhados de vidro se mantiveram escondidos, mas que uma imprensa atenta e actuante pôs a descoberto, é com satisfação que vejo, finalmente, responsáveis políticos preocupados e a sentirem a necessidade de criarem um mecanismo de controlo que permita colocar um travão a esta sucessão de casos que comprometem o país. 

Face à profusão de episódios que suscitaram suspeições ocorridos neste governo socialista, em que no espaço de um ano já ocorreram mais de uma dúzia de substituições no executivo, gerando incómodo, descrédito e desconfiança pública, parece óbvio que a Assembleia da República deva legislar no sentido de que todos quantos possam vir a ser indigitados para altos cargos públicos (deputados, governantes, empresas do Estado, etc) sejam objecto de um inquérito, da carácter confidencial, a ser realizado por um órgão de investigação criminal a fim de detectar eventuais comportamentos ilícitos, para se aferir da idoneidade no exercício de funções públicas. Uma comissão de ética analisaria tal inquérito, acompanhado de testes psicológicos obrigatórios de personalidade, e daria o seu parecer. Este procedimento iria, sem dúvida, enriquecer a nossa democracia e higienizar a administração do Estado, tornando mais difícil qualquer encobrimento.

É que o Estado não pode ser administrado por golpistas, mentirosos e interesseiros com um passado duvidoso, mas sim por cidadãos com ética e moralmente limpos. O mesmo se diga das autarquias, onde os casos de corrupção vindos a público se multiplicam. Merecemos políticos com perfil profissional e social que constituam bons exemplos, e não arrivistas de uma qualquer família política que se encobrem uns aos outros e que apenas olham para os seus interesses pessoais.

Muito se tem discutido acerca da indemnização de quinhentos mil euros que a TAP atribuiu a uma dirigente que foi convidada para secretária de estado. Na verdade, e considerando os biliões de euros que o governo já concedeu àquela empresa do Estado, provenientes dos impostos que quase todos pagamos, bem como a negação de aumentos salariais aos seus trabalhadores, torna-se fácil, muito fácil, desbaratar dinheiros públicos com indemnizações desta natureza, bem como prémios chorudos, porque o Estado lá está para apagar o fogo! Para além de haver ainda muita coisa escondida nesta história mal contada, e num período da nossa vivência colectiva que se debate com dificuldades cada vez maiores, com os preços dos bens a subir constantemente e gerando uma inflacção galopante, é absolutamente aberrante e eticamente reprovável que haja tais desmandos, em que uns comem tudo e outros passam fome ou são mesmo despedidos dos seus postos de trabalho.

Conheci um Primeiro-Ministro (PM) muito cauteloso no processo de nomeação de membros para a sua administração e, do que me lembro, nunca houve broncas relacionadas com a corrupção. Esse PM foi um estadista, foi inteligente e tem toda a minha admiração e simpatia.

Quando me dispunha a finalizar este texto, sou confrontado com mais uma notícia sobre detenções, desta vez na Câmara Municipal de Espinho, por suspeitas de corrupção. É mais um caso que enche de vergonha o país e que corrobora a opinião de muitos cidadãos quando dizem que as autarquias são ninhos de interesses pessoais onde não há moral nem ética. Nem todas serão assim, mas as excepções devem ser poucas. E não são, naturalmente, os cidadãos, os culpados deste estado de coisas, mas sim a ambição desenfreada de uns quantos que se julgam mais inteligentes que os outros.

É por isso que    repito    todos os candidatos a funções dirigentes no Estado, seja no governo, seja na administração, devem ser submetidos a rigorosos testes de personalidade e a uma averiguação de âmbito criminal, para se detectarem tendências e comportamentos suspeitos. Se houver resistência às dinâmicas deste processo, significa, desde logo, que existem receios comprometedores. Haja coragem política e enfrente-se a realidade.

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