O verão. A casa do castanheiro. A varanda de trás. O cantar dos grilos. O vestidinho de alças cor de rosa desabrochada. Coleção de pétalas nos bolsos.
Sandálias de corda. Eu. Menina. Nos olhos o brilho de um segredo difícil de guardar. As sombras dos pássaros no xaile com franjas estendido na horta.
O sinal do ombro esquerdo. Ponto cardeal avulso.
O vento e a colheita dos aromas do fim da tarde. O xaile com franjas arando a poeira dos atalhos.
Mais além os campos sem muros. Voo dali até ao riacho. Eu. Ave. Um aceno inspirado ao carteiro. Perfumadas pétalas dentro de um envelope. Lacre de saliva e verdade. Os pés nus. Chão de pedrinhas macias. Água até aos joelhos. Peixes fugidios. Barquito de papel. Cabelo destrançado. Silêncio à solta.
O verão. A rua empedrada. A casa pintada de branco. A trepadeira florida. O mistério no lanço de escada. A sombra lenta do gato. O livro aberto na varanda. Confidências de vozes sem reino. Migalhas de bolo quente nos calções vincados. Risos. Arrulhar de pombos nas grades intermitentes do jardim. A sineta. O carteiro. O deslacrar do entardecer. O chiar do portão.
Tu. Menino. A bicicleta polida. Recomendações. O jantar sem tolerância de ponto. O tilintar da corrente prateada do relógio. Cortesia do baú ancorado no sótão. O caminho que desce. A vinha. O pórtico dos campos. Pérolas de pechisbeque nos bolsos. Cuspe nos dedos. Ondas do mar no cabelo. Tu. Pirata. O papagaio no autocolante da buzina. A chegada.
Saltas para o riacho na sentimental liberdade dos puros. De repente crescemos. Somos, agora. Temos a idade dos beijos. Eu perdi as asas e alisei o teu mar. Tu perolaste o meu pescoço e acalmaste o vento no meu vestido.
Isabel Do Minho