A Paz

Aníbal Alcino
Aníbal Alcino

Há dias, um colega meu, amigo e pintor, perguntou-me:
– Alcino, você tem dificuldade em vender os seus trabalhos?!..
– Felizmente não, porque tenho algumas pessoas que me compram quase todos os quadros que vou realizando pela vida fora.
– Óh amigo, mas isso é a paz!…
– Não calcule a angústia que me assola quando estando a realizar qualquer pintura – (seja a óleo, aguarela ou acrílico) – penso, que aquilo que produzo, jamais se venderá!…
– Não imagina o quanto é de reconfortante saber-se que aquilo que realizamos, vais, um dia, encontrar pessoas que as vão adquirir e levar para casa, a fim de as embelezar… – É A PAZ!
Só então me lembrei que, quando estava no Alentejo – (nos confins do Alentejo) – mais, propriamente, em Viana do Alentejo, realizei uma exposição de pintura em Évora – (Assembleia Municipal?) – no centro da cidade, na Praça do Giraldo. Foi, talvez, por alturas de 1952, não sei a data ao certo, e a mostra tinha uma série de trabalhos de temática alentejana.
Tive que arranjar transporte apropriado – (uma furgoneta) – mandar fazer molduras, catálogos, com preçário, e imprimir convites para as pessoas mais gradas da cidade. Porém, não vendi nada! Isto é, vendi um só quadro, a óleo, a um senhor que, mais tarde, soube que foi o Engenheiro Ferreira Dias, então ministro da Indústria (?)…
Tanto trabalho, e despesas, e, de trinta e tantas pinturas expostas, só vendi uma!…
Lembrei-me, então, do genial Van Gogh – ( descontando o seu enorme talento, claro!) – que em toda a sua vida, realizou cerca de oitocentas composições picturais e só vendeu uma. Penso que foi o retrato do S. Gachet, médico que o tratou, e que, há poucos dias, foi vendido por dezenas de milhões de euros.
Vejam lá como é a vida!
Aquela aquisição do Eng. Ferreira Dias, já falecido, amenizou, um tanto, as minhas despesas e foi a “salvação” para poder pagar, de imediato, o que devia ao Salão de Exposições, com luz elétrica, limpezas, etc., etc., não vale a pena pormenorizar…
Nessa altura, grassava em todo o país, a “gripe asiática”, e, estive às portas da morte, com altíssimas febres, valendo-me, novamente, os bons ofícios e a competência do médico, Dr. Garrido, que ia, todos os dias, a minha casa para me auscultar e ver como estava.
Na exposição de pintura, em Évora, não entrou ninguém… A sala estava às moscas, todo o dia, por causa, talvez, da gripe asiática e só lá foram o escritor Vergílio Ferreira, professor do Liceu, e o pintor António Charrua, que era um grande artista, tendo emigrado para a Suíça, onde, penso, por lá morreu!…
Por estas razões e por outras, sempre que se anuncia uma exposição de Arte, eu vou visitá-la. Mesmo que, na sua maioria, algumas dessas exposições, não tenham quaisquer interesse para mim.
Sei que há artistas que contam as pessoas, que entram no “salão” para ver os seus trabalhos… Uma visita, uma presença poderá proporcionar-lhes, um pouco de estímulo, a fim de continuar a trabalhar, aguardando que, um dia, as suas produções sejam devidamente apreciadas…
Salvam-se aqueles artistas que devido a certas relações sociais ou politicas, (e também ao seu talento) recebem encomendas da Igreja, Palácios da Justiça, Câmaras Municipais, Palácios citadinos, hotéis, como aconteceu com o talentoso pintor “Camarinha”, que realizou tapeçarias, enormes, por tudo quanto é sítio, e, ainda, Almada Negreiros, Jorge Barradas, Cargaleiro, Júlio Resende, Augusto Gomes, Que-rubim Lapa, Lino António, Júlio Pomar, etc., a que se poderão juntar, Dórdio Gomes, Joaquim Lopes, Botelho, Barata Feio (escultor), Francisco Franco, Leopoldo de Almeida e muitos outros, mas que de momento não me lembro.
Sobre esta temática haveria muito mais a dizer, mas, por agora, fico-me por aqui.

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