Cantas bem, mas não me convences

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O provérbio popular com que intitulo esta pequena história que hoje aqui trago, história essa ocorrida no século XVIII, parece-me perfeitamente adequado à situação ocorrida, o que não impedirá, contudo, o eventual leitor de facilmente encontrar outros que, de igual modo, se ajustariam ao sucedido  

Como é sabido a costa portuguesa, e muitas das povoações ribeirinhas foram, em especial nos finais do sec. XVIII e início do sec. XIX, frequentemente assoladas por corsários, em especial originários do Norte de África ou de França, estes últimos mais atuantes no Norte do país, enquanto os primeiros operavam em especial no Sul.

A atividade comercial de Viana do Castelo, como um dos portos mais importantes do Norte era, em muito, prejudicada por tais ações que incidiam, não só em relação à navegação de comércio, como também à da pesca, chegando algumas das vezes a serem apresadas embarcações na barra e até mesmo no interior do porto.

Os prejuízos assumiam proporções tais que, na impossibilidade dos navios da Armada Real poderem, pelas suas características, garantir um patrulhamento e defesa eficazes, um grupo de comerciantes de Viana do Castelo resolveu mandar construir, a expensas suas, um navio com as características adequadas para o combate a tais corsários, navio esse oferecido, em 1797, à Armada Real (sobre o navio em causa e a sua ação ver Cadernos Vianenses Tomo 48). *

É pois bem natural que, no dia 9 de Maio de 1793, o bergantim genovês “Nª Srª de la Guardia” ao entrar em Viana  do Castelo com 149 franceses a bordo , tivesse suscitado grande desconfiança e algum temor , isto apesar das alegações do capitão do navio em causa de que só transportava sal e que os franceses embarcados, entre os quais quatro mulheres e uma criança, haviam sido expulsos de Cadiz e se dirigiam para Baionne, tendo a arribada ficado a dever -se à carência de mantimentos e água, originada pelo grande número de passageiros.

Tais alegações não lograram dissipar a desconfiança e o temor suscitados pois foram adotadas excecionais medidas de segurança, como fossem a colocação de várias sentinelas nas proximidades do navio, bem como a colocação, nas imediações do local, de grande número de soldados de prevenção para a eventualidade de alguma ação hostil por parte dos franceses, ao mesmo tempo que a artilharia do forte ficou apontada para o navio durante toda a sua permanência no porto.

Pese embora a verossimilhança do afirmado pelo capitão do navio nada parece ter sido suficiente para o atenuar, durante a permanência do navio em Viana do Castelo, das medidas de segurança adotadas.

A partida de Viana do Castelo, verificada em 15 de maio, foi objeto de comunicação das autoridades locais, comunicação essa que em que parece notório o grande alívio pela estadia não ter dado origem a qualquer incidente.

N.R. – * Tratava-se de um navio escuna de 53 palmos (11,6 m).

Escunas são navios pequenos e de forma alongada. Possuem dois mastros inclinados para trás, com velas latinas e uma ou duas gáveas.

O velame destes barcos é extremamente gracioso e fácil de manobrar.

Um gurupés dá ocasião a que se possa içar dois ou três cutelos.

Quando o vento bate de popa, pode dispor-se uma vela latina de escaler.

É semelhante ao “brigue” em número de mastros e na estrutura, chegando a haver cruzamentos de velas entre ambos, originando assim o tipo chamado “Brigue-Escuna”.

Fonte: Arquivo Histórico Ultramarino Reino cx. 183 pasta 13

Carlos Matos

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