O recolhimento de Santiago da protecção da Santa Casa da Misericórdia de Viana

Alfredo Faria Araújo
Alfredo Faria Araújo

Objectivos ou Alvos Gerais
A grande benemérita Suzana Brava pretendeu, no seu testamento, melhorar as condições de vida do Recolhimento de Santiago na vila de Viana da Foz do Lima.

Trata-se de uma senhora nobre, viúva, abastada nos seus rendimentos e que fez o referido testamento a 01 de Janeiro de 1638, acudindo ou fornecendo o sustento de algumas mulheres enclausuradas, atribuindo e tornando mais conhecido o Recolhimento de Santiago, desde o nascimento no séc. XIV até ao primeiro quartel do séc. XX.

Em 1594, Oliveira da Rocha também grande benfeitor da Santa Casa da Misericórdia de Viana da Foz do Lima, legou, no seu testamento, 40 mil reis anuais a fim de doar a quatro órfãs, que aspiravam casar, desde que virtuosas e de boa fama.

Ana da Cunha, em 1621, legou rendas, dotando em casamento, e exigindo só conduta irrepreensível às candidatas.

Deste mesmo modo, Manuel Pereira Pinto, que em testamento de 1681 fornecia dotes, anualmente, a jovens órfãs, legou 100 mil reis a uma mulata que criara, exigindo apenas que a beneficiada se mantivesse honrada até à idade de casar. Deixou, também, 150 mil reis a outra mulata que se não merecesse a dádiva seria repartida por duas órfãs pobres e honradas.

João Correia Garcia, estabelecido na Bahia, deixou 400 mil reis a uma sobrinha religiosa em Vila do Conde para que lhe fossem atribuídos 16 mil reis anuais do rendimento, que após a morte dela, beneficiariam os pobres.

Salientar o cunho ou a marca da população recolhida
Os Recolhimentos de mulheres tiveram forte propagação na Europa católica em consequência do Concílio de Trento. Eram como uma espécie de resposta social à fatalidade de preservar a honra e a virtude, muito especialmente, às órfãs e às viúvas ou colocar novamente dentro das regras consideradas aceitáveis do comportamento das mulheres como prostitutas que, a partir do séc. XVII eram encaminhadas para esse tipo de recolhimento.

Neste contexto insere-se o funcionamento do Recolhimento de Santiago, nos séc. XVII e XVIII, administrado pela Santa Casa da Misericórdia de Viana da Foz do Lima, tendo por incumbência fundamental fornecer asilo a mulheres nobres da referida vila, viúvas ou órfãs.

Todas elas carecidas de fortuna para ingressar nos Conventos, ou outras mulheres casadas ou não, que precisassem de se acolher na Instituição a fim de guardar bem e com cuidado, a sua honra.

Distinguir ou especificar o relacionamento das recolhidas com a instituição protectora
Não se julgue que no Recolhimento eram tudo rosas. Também havia atritos. Após a admissão de D. Domingas Lascol elaboraram novos estatutos e nomearam-se auxiliares da regente a fim de se dar mais força e mais disciplina, pois a vida em comunidade é diferente. E, se teve vantagens também pecou por excesso de poder da Mesa, que por vezes redundavam em actos de indisciplina.

As regentes mais opostas aos privilégios da Mesa, de vez em quando, admitiam mulheres por iniciativa própria, sem consultar superiormente e isto aconteceu em 1714, quando uma mulher não tinha efectuado o juramento, perante a Mesa, e tendo sido despedida e readmitida a seguir, após o juramento. Uma regra várias vezes desrespeitada era o normal.
Acontece que muitas vezes eram as regentes que transbordavam nas suas funções. De vez em quando, era o dinheiro ou a “cunha” de pessoas importantes que impediam a entrada de uma desgraçada no Recolhimento. Os excessos eram cometidos não só pelas regentes, como também pela Mesa. Uma desorganização total.

Com o avançar do tempo foi-se alargando a selecção de pretendentes à entrada do Recolhimento. Em 1773, a petição de uma mulher de Braga configurou uma radical alteração nos critérios de escolha, cabendo obrigatoriedade de serem somente consideradas recolhidas as nobres.

Foram, ainda, admitidas criadas, por vezes de “maus costumes”, mas a Mesa de 1747 constatou que entravam e saiam sem as devidas autorizações, o que potenciava conflitos.

Destrinçar mudanças na sociedade e efeitos na população recolhida
É de salientar algumas admissões que resultaram da necessidade de algumas recolhidas gozarem ausências temporárias.

A saída teria de ser autorizada pela Mesa, depois de analisada a petição e juntar os pareceres de quem de direito.

Em 1750, com a saída de duas recolhidas que argumentaram doença, que sofriam há mais de um ano e sem melhoras, informavam que necessitavam de tomar banhos em termas. Tomaram os pareceres da regente, do médico e do cirurgião-mor, tendo sido autorizada a ausência por três meses, aumentando o tempo se necessário para o restabelecimento. Porém, precisavam da autorização da Mesa para o reingresso.

Outra recolhida fez uma petição alegando precisar de sair do Recolhimento para tomar ares da Pátria e banho no rio Lima.

O aumento de pedidos de saídas temporárias provocava abusos como apoio a familiares, banhos de mar e outros, diminuindo o efeito das regras de reclusão e afastamento do próprio Recolhimento.

Referência: Magalhães, António – Práticas de Caridade na Misericórdia de Viana da Foz do Lima; pág. 565 a 581.

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